Cento e noventa ônibus, responsáveis por sete linhas na Muzema, na Zona Oeste, tiveram alteração em seus itinerários, na manhã desta segunda-feira. Desde sábado, a região tem sido invadida por milicianos, que tentam retomar o controle da região, atualmente de posse do Comando Vermelho. Relatos nas redes sociais apontam que houve tiroteio no bairro durante a madrugada, entre 1h e 5h. Segundo o RioÔnibus, cerca de 66 mil passageiros foram impactados com a mudança nas rotas, que aconteceu entre 5h30 a 8h20.
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Veja as linhas de ônibus que foram impactadas:
- 878 (Tanque x Praia da Barra via Rio das Pedras)
- 555 (Rio das Pedras x Gávea)
- 557 (Rio das Pedras x Copacabana)
- 550 (Cidade de Deus x Gávea)
- 863 (Rio das Pedras x Barra da Tijuca)
- 343 (Jardim Oceânico x Candelária via Rio das Pedras)
- 862 (Rio das Pedras x Barra da Tijuca)
Em nota, o Rio Ônibus afirmou que os itinerários já foram normalizados, mas que a decisão na mudança das rotas vem “subtraindo mais uma vez o direito de ir e vir dos cidadãos cariocas. No momento, todas as linhas da região estão com desvios de itinerário”.
“É um verdadeiro absurdo, que se repete quase todos os dias, nos mesmos lugares, e nenhuma providência é tomada. O Rio Ônibus repudia os atos criminosos que afetam tanto a vida da população e apela para que as autoridades tomem as providências para garantir o direito básico de deslocamento das pessoas”, conclui o comunicado.
Também em nota, a Polícia Militar informa que equipes do 31º BPM (Recreio) intensificaram a presença policial na comunidade da Muzema. O Batalhão de Operações Especiais (Bope) segue atuando na região, afirma a corporação. “A Polícia Militar reitera que permanece na comunidade para garantir a segurança da população e a normalidade do trânsito no local. Não há registros de disparos na Muzema”, afirma o comunicado.
Fim de semana de tiroteios e ônibus sequestrados
De acordo com relatos em redes sociais, os confrontos na Muzema começaram na madrugada de sábado. Vídeos em redes sociais mostram homens armados, vestidos de preto, a maioria com os rostos cobertos, circulando pela região. Segundo as testemunhas, são milicianos que tentam retomar a região, que está sob o controle do Comando Vermelho (CV).
Em um relatório parcial sobre o trabalho de policiais do 31º BPM (Recreio dos Bandeirantes) na Muzema, nesse final de semana, há seis tópicos informando poucos acontecimentos. Nenhum deles, contudo, cita a invasão da região por milicianos no sábado (19), quando andavam tranquilamente pelas ruas portando fuzis. Em uma das descrições, inclusive, agentes destacam não haver “alteração” ou “ocorrência” na localidade.
No geral, o documento, chamado de parte diária, aponta apenas substituição de policiais, rondas, baseamento de blindado e o uso de câmera nos uniformes.
Confronto entre tráfico e milícia
No final de 2023, o Comando Vermelho iniciou tentativas de invasão a favelas do Itanhangá e na Gardênia Azul, ambas na Zona Oeste. A conquista aconteceu em fevereiro deste ano, quando ataques simultâneos fizeram a milícia dessas regiões recuar. Desde então, esses grupos criminosos têm entrado constantemente em confronto.
Os efeitos na vida dos moradores incluem riscos nos tiroteios, toques de recolher, aumento da cobrança de taxas, alteração no funcionamento de serviços públicos, como o itinerário de ônibus, além do fechamento de escolas e postos de saúde em dias de maior insegurança.
Em julho, uma série especial do GLOBO mostrou que, ao menos desde 2021, o Comando Vermelho tem articulado um plano de expansão no Rio de Janeiro, que visa à tomada de territórios pertencentes à milícia e ao Terceiro Comando Puro.
O desejo do CV em tomar a região da Grande Jacarepaguá, onde ficam bairros historicamente dominados pela milícia, existe há cerca de uma década. Para a facção, além da demonstração de força, essa localidade é estratégica por possibilitar um “cinturão” da facção no entorno da Floresta da Tijuca — o que favoreceria eventuais fugas em caso de operações e tentativas de invasão por rivais. Hoje, a única favela que falta para que o plano se concretize é Rio das Pedras, o alvo da vez da facção.
A Favela da Muzema, como ficou conhecida, surgiu nos anos 1970, e cresceu, na década de 90, a partir da ocupação por grupos de milicianos. Seus primeiros moradores eram trabalhadores vindos de outros estados para atuar nas construções que eram erguidas na Barra da Tijuca, que vivia o seu boom imobiliário na época.
Em 2003, a região era de poucas casas localizadas de frente para a Estrada de Jacarepaguá. Três anos depois, as ruas de barro já apareciam abertas e, em 2010, as primeiras casas loteavam o terreno. O crescimento dos imóveis escalonou a tal ponto que, de 2010 a 2016, a Secretaria municipal de Urbanismo chegou a embargar 101 construções, emitiu 107 notificações e realizou 25 laudos de vistoria administrativa enviados para demolição.
O grupo criminoso, de forma ilegal, continuou a investir nos prédios, cujos apartamentos eram vendidos a valores próximos ao de áreas valorizadas da cidade. Dois deles desabaram em 2019 e mataram 24 pessoas.
Dois meses depois desse acontecido, os empreendimentos continuaram. A milícia voltou a construir de forma desenfreada na Muzema e “reorganizou” um sistema de cobrança de taxas. Os valores naquele ano chegavam a R$ 160 para moradores de casas e de R$ 120 para aqueles que viviam em apartamentos.