Laísa Dall’Agnol
Quatro importantes líderes partidários e do Congresso Nacional entrarão em 2025 com muitas dúvidas a respeito de seus futuros. O destino de cada um passa, em boa parte, pela decisão de se aproximar ainda mais ou se distanciar do presidente Luiz Inácio Lula da Silva. Rodrigo Pacheco (PSD-MG) e Arthur Lira (PP-AL) encontram-se nos últimos dias de seus mandatos nas presidências do Senado e da Câmara, respectivamente. Embora estejam perto de voltar à planície, acumulam muito capital político para negociar posições privilegiadas no ecossistema de Brasília. Outros dois nomes de peso com situação indefinida são os deputados Elmar Nascimento (União Brasil-BA) e Marcos Pereira (Republicanos-SP). Eles sonharam em comandar a Câmara a partir de fevereiro de 2025, com chances reais de sucesso. O parlamentar baiano chegou a ter a simpatia de Lira, que depois apoiou Hugo Motta (Republicanos-PB), obrigando Pereira a abrir mão de sua pretensão em favor do colega de legenda. Embora a aproximação do recesso e a parada temporária de Lula em razão de urgência médica tendam a adiar as articulações, é certo que o quarteto estará no topo das negociações políticas já no início do próximo ano.
O governo tem muito interesse na aproximação com os quatro líderes, uma vez que suas legendas juntas somam quase 200 deputados e mais de trinta senadores. Esse aglomerado é estratégico não apenas para uma governabilidade mais tranquila de Lula no Congresso, mas também para os projetos eleitorais futuros do presidente. No que diz respeito à interlocução com o Legislativo, as últimas semanas foram marcadas por tensão nas negociações em torno do pacote fiscal e do pagamento de emendas parlamentares, que paralisaram a tramitação da necessária medida.
O aceno de Lula ao quarteto de líderes pode levar o governo um pouco mais para a direita. Ele venceu a difícil eleição de 2022 acenando como nunca ao centro ao trazer o ex-tucano Geraldo Alckmin (PSB) para concorrer como seu vice e, depois, compondo com Simone Tebet (MDB) e outras lideranças do espectro moderado no segundo turno. No entanto, não teve o apoio formal do PSD, União Brasil, PP e Republicanos — esses dois últimos, pelo contrário, estiveram no palanque de Jair Bolsonaro. Ao chegar ao governo, Lula foi loteando a Esplanada e entregou nacos importantes às quatro legendas (veja o quadro). Com uma nova reforma ministerial no horizonte, o petista sente que pode se aproximar mais delas, recalibrando a divisão das pastas e abrindo espaço para siglas amplamente vitoriosas na última eleição.
O maior desafio será definir o que fazer com Arthur Lira. Aliado complexo do governo Lula nos dois primeiros anos de mandato, quando ora se aproximou, ora trocou caneladas, o alagoano já recebeu sinalização de que pode ter o apoio de Lula em seu projeto de chegar ao Senado em 2026. A dificuldade até lá é achar uma pasta grande o suficiente para Lira. A mais cotada é a da Saúde, que concentra o maior volume de emendas e que sempre foi alvo de cobiça do presidente da Câmara e pivô dos embates dele com o ministro Alexandre Padilha (Relações Institucionais). Mas até mesmo aliados do presidente da Câmara veem com ressalvas a possibilidade de ele ser ministro. Uma alternativa a isso seria Lira indicar alguém para a Saúde. Em 2021, ele tentou emplacar Ludhmila Hajjar para a pasta, mas a cardiologista foi vetada por Bolsonaro. “Lira quer manter a influência sobre as emendas e no governo. A opção mais viável seria um cargo alto em uma estatal”, diz um aliado.
Caso o namoro com o governo não avance, Lira tem um outro caminho para manter um bom naco de poder. Ele pode permanecer na Câmara e tentar voltar a liderar um grande bloco de deputados, função que exerceu informalmente e que o projetou como líder do Centrão durante o governo Bolsonaro — o que, mais tarde, o alçaria à presidência da Câmara. Na época, o grupo sob a sua influência incluía partidos como PP, PL, PSD, MDB, DEM, PTB, PROS, Solidariedade e Avante. Lira poderia ainda assumir a frente de uma comissão importante da Casa, como a de Constituição, Justiça e Cidadania (CCJ), que já presidiu em 2015. Essa foi a forma que o ex-presidente do Senado Davi Alcolumbre (União Brasil-AP) encontrou para continuar exercendo sua influência após ajudar a eleger Pacheco. A possibilidade de assumir um ministério no governo, porém, daria a Lira maior projeção para tentar voos mais altos no próximo pleito. “O que vai ser em 2026 vai depender muito do que acontecer em 2025 e também em 2026”, disse no fim de novembro.
O futuro de Pacheco é igualmente muito incerto. Ele pode virar ministro e depois disputar o governo de Minas Gerais. O atual presidente do Senado seria útil ao governo por ser de um partido importante e com capilaridade em diversos estados — que abriga quadros de diferentes espectros, desde aliados como Eduardo Paes (PSD), prefeito do Rio, até gente mais perto de Bolsonaro, como o governador do Paraná, Ratinho Jr. (PSD). Também conta a favor de Pacheco a proximidade que ele tem com Alcolumbre, que deve voltar a comandar o Senado. Por fim, ele é uma peça importante no xadrez de Minas Gerais. Segundo maior colégio eleitoral do país, o estado é decisivo para eleger qualquer presidente. “Pacheco não decidiu ainda. Seria um grande governador”, afirma Otto Alencar, líder do PSD no Senado e próximo a Lula. A respeito da possibilidade de sair da presidência do Senado direto para uma vaga na Esplanada, aliados avaliam que há um risco razoável de ingressar no governo na hora errada. Se a popularidade da gestão não melhorar até 2026, o prejuízo de imagem seria enorme.
A negociação do governo por aproximação tende a ser mais simples com Elmar Nascimento e Marcos Pereira. Líderes importantes em seus partidos, ambos abriram mão de suas candidaturas a presidente da Câmara para apoiar Hugo Motta. A possível indicação para ministérios, portanto, poderia funcionar como uma espécie de prêmio de consolação que o governo estaria disposto a conceder. Elmar foi relator da chamada PEC da Transição, importante para Lula antes mesmo de ele iniciar o mandato, e foi depois cotado para assumir o Ministério da Integração e do Desenvolvimento Regional no início do governo. A indicação, no entanto, não ocorreu por causa de divergências (hoje já superadas) com o PT da Bahia, especialmente o grupo ligado ao ministro Rui Costa. Recentemente, o deputado afirmou que lançar Ronaldo Caiado ao Planalto em 2026 seria uma “traição” do partido a Lula. Já Marcos Pereira, bispo da Universal e presidente do Republicanos, ajudaria o petista a se aproximar dos evangélicos, segmento mais próximo do bolsonarismo.
A marcha governista desses quatro líderes e seus partidos passa especialmente pela figura de Lula, mas não ocorrerá sem estar na mesa todas as cartas para o jogo eleitoral de 2026. No cenário mais favorável ao governo, Lula teria um ministério mais robusto, ganharia tração na negociação sempre difícil que trava com o Congresso e deixaria isolada a oposição na metade final de seu mandato, quando o horizonte maior será o da próxima — e de difícil projeção — disputa nacional. Só falta combinar isso com o quarteto de caciques partidários.
Publicado em VEJA de 13 de dezembro de 2024, edição nº 2923