- Contexto: Ex-presidente da Bolívia Evo Morales chama de ‘mentira’ suposto caso de estupro de menor sob investigação
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Nesta terça-feira, a ABC reportou duas novas rotas bloqueadas, que se somam às três de segunda-feira. Em Paratono, um povoado que liga Cochabamba a La Paz, foram registrados pelo segundo dia consecutivo confrontos entre civis e partidários de Morales e a polícia, sem confirmação de feridos. Os civis, em sua maioria cocaleiros, usaram pedras, fogos de artifício e fogueiras, e a polícia respondeu com gás lacrimogêneo, de acordo com as imagens da televisão Unitel.
Os protestos para proteger Morales começaram na segunda-feira, dia que terminou com pelo menos seis presos. À frente dos bloqueios está o Pacto de Unidade, uma coalizão de organizações próximas ao ex-presidente de 64 anos, que está se mobilizando “para proteger a liberdade, a integridade e (impedir) o sequestro” de Morales, de acordo com um manifesto.
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Além disso, segundo o El País, os bloqueios também têm o objetivo de pressionar o governo pela falta de dólares e a escassez de combustível, dois problemas da crise econômica do país.
O governo convocou conversas com Morales na segunda-feira, mas sem sucesso.
Morales, o primeiro indígena a governar a Bolívia entre 2006 e 2019, está sendo investigado pelos crimes de “estupro e tráfico de pessoas”. Na quinta-feira, ele não cumpriu uma intimação do Ministério Público do departamento de Tarija para depor, o que poderia levar as autoridades a ordenar sua prisão.
Hoje um opositor do governo de seu ex-ministro Luis Arce, o ex-presidente chama o caso de “mais uma mentira” que foi investigada e arquivada pelo sistema judiciário em 2020.
O suposto abuso remonta ao período em que o líder cocaleiro era presidente, em 2015. Morales se envolveu com uma menor de 15 anos, com quem teve uma filha em 2016, segundo a denúncia que está sendo investigada pelo MP. Os fatos teriam ocorrido em Tarija, um departamento no sul da Bolívia.
De acordo com o processo, os pais da vítima — também investigados — a inscreveram na “guarda juvenil” de Morales “com a única finalidade de escalar politicamente e obter benefícios […] em troca de sua filha menor”.
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A defesa do ex-presidente alega que o caso já foi revisado e arquivado em 2020. Afirma ainda que a acusação é infundada por falta de provas, já que a vítima se recusa a testemunhar e seus pais são acusados, não acusadores. A acusação baseia-se principalmente em uma certidão de nascimento onde o suposto pai reconhece a filha como tendo 16 anos na época.
Em seu manifesto, os seguidores de Morales atacaram Arce, outrora aliado do ex-mandatário e que agora mantém uma disputa pela candidatura do partido governista para as eleições presidenciais de 2025.
“O governo traidor […] não respondeu ao nosso pedido, nem teve a vontade de convocar para o diálogo sobre o abastecimento de combustível, a escassez de dólares, o aumento do custo de vida, o grave endividamento interno e externo”, entre outras questões que afetam a economia, afirmou o Pacto de Unidade.
Com o protesto dos apoiadores de Morales em curso, o presidente boliviano mudou, nesta segunda-feira, todo o alto comando policial.
— A polícia tem a missão constitucional” de “defender o povo de toda ameaça que possa atentar contra sua integridade — disse Eduardo del Castillo, ministro de Governo (Interior), durante a cerimônia de posse de 20 oficiais.
Na segunda-feira, a promotora responsável pela investigação, Sandra Gutiérrez, não quis responder aos jornalistas se pedirá a prisão de Morales.
— Por estratégia investigativa, vamos evitar dar mais detalhes sobre o caso — comentou.
O pai da suposta vítima foi preso na sexta-feira por não comparecer, assim como Morales, para depor ao MP. O homem teve decretada prisão preventiva de quatro meses, de acordo com a Promotoria.
Em meio ao primeiro dia de protestos, Morales voltou a acusar o governo Arce de reativar o processo judicial para prendê-lo ou até mesmo matá-lo, com o objetivo de impedir que ele concorra à Presidência em 2025.
“Eles pretendem nos inabilitar através de processos judiciais. E, finalmente, promover tal nível de violência legitimada que resulte em episódios como o atentado” frustrado contra a ex-presidente da Argentina, Cristina Kirchner, em 2022, escreveu Morales na rede social X.
Morales e Arce travam uma disputa pelo poder há meses. O influente líder indígena acusou seu ex-ministro da Economia de se aliar a juízes para impedi-lo de concorrer novamente à Presidência em 2025 — Arce até agora não disse se concorrerá. Em setembro, Arce chegou a acusar o ex-aliado e padrinho político de tentar um golpe de Estado através das marchas e bloqueios. Segundo o presidente, Morales ameaçou “quer fazer o que a Constituição do Estado não lhe permite fazer: se requalificar como candidato.”
Em dezembro, o Tribunal Constitucional Plurinacional (TCP) fixou em dois mandatos, contínuos ou não, o tempo máximo em que o presidente e o vice-presidente poderão permanecer no cargo. Morales já cumpriu três: entre 2006 e 2009, 2009 e 2014, e 2014 e 2019. Morales argumenta que pode se candidatar novamente, já que passou um mandato presidencial depois de deixar o poder. Com o apoio da ala de seu partido, ele tenta reverter a proibição por meio da pressão popular.