Marcela Mattos
Como parte do acordo após conquistar os votos da oposição durante a sua campanha ao comando da Câmara, o deputado Hugo Motta (Republicanos-PB) entregou a vice-presidência ao PL, partido do ex-presidente Jair Bolsonaro. Desde então, correm especulações de que a dupla, na primeira oportunidade, aproveitaria a cadeira presidencial para dar andamento a pautas de interesse da direita.
Na próxima semana, será a estreia do deputado Altineu Côrtes (PL-RJ), fiel escudeiro de Bolsonaro, como presidente em exercício da Câmara. Ele assumirá o comando porque Hugo Motta estará acompanhando o presidente Lula em viagem ao Japão – o regimento da Casa determina que o vice ocupe a cadeira presidencial sempre que ele se afastar da capital federal por de mais de 48 horas.
Com a Câmara nas mãos de Côrtes, cresceu o rumor de que ele poderia dar andamento ao projeto que anistia os vândalos do 8 de janeiro, a principal bandeira de parlamentares bolsonaristas. Na última semana, lideranças do PL tentaram um compromisso de Motta para impor um regime de urgência ao projeto, com tramitação acelerada e votação direta no plenário, mas não obtiveram sucesso. No lugar, ficou pactuado que, durante a ausência do timoneiro, haverá uma pauta amena e voltada à agenda feminina.
O vice-presidente, ao menos em tese, poderia reverter o quadro e pautar a anistia. Questionado, ele próprio não aplaca as suspeitas: “Tudo pode acontecer”, disse Altineu Côrtes a VEJA.
Apesar do tom misterioso, aliados próximos veem como baixas as chances de o vice fazer qualquer movimento à revelia de Hugo Motta. Embora sejam de partidos diferentes, os dois são aliados e têm boa relação. Além disso, não é praxe na Câmara que presidente e vice não atuem em sintonia.
Um dos casos mais emblemáticos aconteceu em 2016, quando o então vice-presidente Waldir Maranhão, após ser alçado como presidente interino, anulou a sessão que aprovou o impeachment de Dilma Rousseff – à época, ele substituía Eduardo Cunha, que fora afastado da presidência da Câmara por ordem judicial. Pressionado, Maranhão acabou revogando a sua própria decisão no dia seguinte.
Mais recente, em 2022 o então presidente Arthur Lira (PP-AL) destituiu Marcelo Ramos (PSD-AM) da vice – Ramos era um ferrenho crítico ao então presidente Jair Bolsonaro, de quem Lira era aliado. Após nova eleição, o deputado bolsonarista Lincoln Portela (PL-MG) assumiu o posto.