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De aproveitamento de resíduos sólidos a criação do monitor da sustentabilidade, mulheres impulsionam pesquisas para o desenvolvimento da Amazônia 

Tácita Muniz

Resíduos da castanha-do-brasil na produção de mudas e adubação de plantas de café; Ecoepidemiologia de doenças infecciosas em paisagens da região Amazônica sob efeito de desmatamento: implicações na saúde única; e Governança policêntrica, mudanças climáticas e desenvolvimento sustentável na Pan-Amazônia. Esses são os títulos de algumas das pesquisas desenvolvidas no Acre que recebem recurso da Fundação de Amparo à Pesquisa do Estado (Fapac). Além de serem estudos voltados para a Amazônia, há outro ponto em comum: todos foram desenvolvidos por mulheres.

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Estudos têm recebido incentivos da Fapac e proporcionado avanço da ciência. Foto: Marcos Vicentti/Secom

Visando ao desenvolvimento científico, tecnológico e de inovação para a comunidade científica, setor empresarial e social, a Fapac tem a missão de fomentar a pesquisa no estado. Além disso, tem lançado, nos últimos meses, linhas de pesquisa que fortalecem ainda mais a inserção de mulheres na ciência.

É o caso do projeto Mães da Ciência, que apoia e incentiva as mães solo no desenvolvimento de pesquisa científica como meio de fomentar potencialidades para futuros empreendimentos, contribuindo para a elevação da qualidade de vida e a conquista de independência financeira. As bolsas contemplaram 769 mulheres neste primeiro momento.

Os programas têm incentivado estudos que contemplam a Amazônia e também expandem a participação de mulheres que são referência em suas áreas, coordenando equipes e desenvolvendo ações que fortalecem o trabalho científico em diversas áreas de conhecimento.

“O governo do Acre está liderando os dois maiores programas de pesquisa de gênero e de empreendedorismo feminino e atípico do Brasil. Os dois são financiados por emendas parlamentares, principalmente da ex-senadora Mailza [Assis]. Além disso, há outros programas em que há muita participação da mulher cientista, das universidades e da mulher indígena”, destaca Moisés Diniz, presidente da Fapac.

Mulheres em pesquisa de ponta

A engenheira agrônoma Aliny de Lima lidera uma pesquisa sobre aproveitamento de resíduos sólidos na agricultura familiar. O objetivo é levar alternativas de baixo custo para aumento de produção familiar por meio de sistemas sustentáveis.

A pesquisadora acredita que a participação da mulher no âmbito acadêmico e de pesquisa tem se expandido cada vez mais, porém, há ainda desafios com que se depara diariamente. “A principal dificuldade é a aceitação. Por se tratar de uma área predominantemente masculina, muitas vezes o produtor prefere ser atendido por um homem. Levando em consideração o maior esforço que nós, mulheres, precisamos fazer para ser reconhecidas profissionalmente, acredito que, surgindo oportunidades, possamos ocupar estes espaços com maestria e sucesso. O maior desafio é conseguir esta oportunidade”, avalia.

Engenheira agrônoma Aliny de Lima lidera pesquisa sobre aproveitamento de resíduos sólidos na agricultura familiar. Foto: acervo pessoal

Para Aliny, o exemplo e a representatividade servem como vitrine para que as mulheres se fortaleçam: “Sei que inspiro outras mulheres, porque sempre me inspirei em mulheres para conseguir ocupar os espaços onde trabalhei e atuei como profissional”.

Já a farmacêutica Andreia Brilhante, mestre em Meio Ambiente e doutora em Saúde Pública, tem um estudo sobre a ecoepidemiologia de doenças infecciosas em paisagens da região Amazônica sob efeito de desmatamento e suas implicações na saúde única. “Atualmente desenvolvo pesquisas com leishmaniose tegumentar americana no Acre, abordando como a doença se comporta no ambiente, na população humana, animais domésticos e vetores”, explica.

Sobre o investimento em pesquisa, ela destaca que é fundamental para o desenvolvimento de qualquer região, “para além do desenvolvimento científico e tecnológico do país, e também no direcionamento de políticas públicas no controle desse e de outros agravos”.

Andreia analisa que nos últimos anos as mulheres têm ocupado espaços em todos os segmentos da área científica e atribui isso a um trabalho que envolve as mulheres que vieram antes dela. “Hoje podemos ver muitas mulheres liderando pesquisas de ponta em prol da nossa sociedade. Na minha área, ainda são poucas mulheres atuando, existem mais homens, mas acredito que os desafios estão equilibrados em relação aos homens. Tive excelentes profissionais mulheres que me orientaram e tornaram o caminho muito mais fácil para mim”, relata.

Programas de incentivos à pesquisa facilitam e expandem participação de mulheres em área de atuação em todo o estado. Foto: acervo pessoal

Ver uma mulher se destacando, seja qual for a área, para Andreia, é combustível para tornar a sociedade igualitária. “Podemos ser fonte de inspiração para as meninas que estão na escola e que, com os incentivos adequados no ambiente escolar, podem se tornar excelentes pesquisadoras”, acredita.

A referência do feminino no campo de pesquisa sempre existiu. Andreia relembra que muitos estudos, descobertas e pesquisas foram liderados por mulheres especialistas em sua área, mas também acredita que os incentivos ajudam a expandir ainda mais esse universo.

“Vejo que isso já está acontecendo. Em nosso país, já temos grandes pesquisadoras com reconhecimento internacional e acredito que as mulheres podem trazer um olhar humanístico, uma visão diferente, que muito pode agregar ao meio acadêmico e científico. Com o passar do tempo, os incentivos de financiamentos a programas voltados para a participação de mulheres e meninas na ciência têm aumentado, favorecendo a participação da mulher na academia”, completa.

Reduzindo as diferenças

Na Comunicação Social, a doutora em Ciência Luci Teston lidera um projeto de pesquisa financiado pela Fapac e Conselho Nacional de Desenvolvimento Científico e Tecnológico (CNPq) intitulado “Governança policêntrica, mudanças climáticas e desenvolvimento sustentável na Pan-Amazônia”.

O projeto visa à criação de um monitor político da sustentabilidade na Amazônia, destinado a acompanhar as percepções e ações de atores políticos variados que têm poder de incidência sobre o desenvolvimento sustentável da região pan-amazônica.

É um projeto conjunto, que conta com uma equipe de oito pesquisadores (sete deles vinculados a universidades da Amazônia Legal) e envolve oito fundações de amparo à pesquisa. No Acre, Luci coordena a equipe de pesquisa no âmbito da Fapac.

Luci Teston lidera projeto de pesquisa financiado pela Fapac e Conselho Nacional de Desenvolvimento Científico e Tecnológico (CNPq). Foto: acervo pessoal

“É realizado um trabalho em conjunto para monitorar as percepções e ações que governos e instituições de diferentes esferas políticas [subnacional, nacional e internacional] adotam em relação à agenda de desenvolvimento sustentável da Pan-Amazônia. Busca-se  compreender os espaços de cooperação e conflito que existem entre os atores políticos analisados, combater campanhas de desinformação sobre mudanças climáticas que dificultam ações coletivas e avançar em debates sobre a criação de uma governança de múltiplas escalas para a região pan-amazônica”, explica.

A pesquisadora diz ainda que iniciativas como o Amazônia +10, em que está inserida, são fundamentais para fortalecer a pesquisa no estado e na região amazônica, a partir de projetos conjuntos. Entretanto, mesmo reconhecendo avanços, acredita que a disparidade de gênero ainda é uma realidade.

“Ainda há sub-representação em algumas áreas, como nas ciências exatas, menor espaço em cargos de liderança, desigualdades econômicas em termos de infraestrutura para o desenvolvimento de pesquisas, acesso a fontes de financiamento desiguais, [além de ]sobrecarga de trabalho e maternidade, que tendem a ser desafios enfrentados pelas mulheres”, lista.

Outro ponto que precisa ser mudado, segundo Luci, é o fato de que, muitas vezes, os estudos sobre a Amazônia não são coordenados por quem de fato conhece a região. “Entretanto, convém destacar iniciativas para a equidade, como editais visando promover a diversidade, a pluralidade e a participação de mulheres na ciência, fortalecer a equidade de gênero e étnico-racial e premiar mulheres pelo reconhecimento do valor de suas pesquisas. O caminho envolve o reconhecimento dos desafios enfrentados pelas pesquisadoras e, a partir deles, a adoção de políticas públicas mais robustas, visando inibir desigualdades de gênero”, avalia.

Questionada sobre o que espera para o futuro no âmbito da pesquisa no estado, Luci destaca que iniciativas como as que vêm sendo realizadas pela Fapac no contexto do Amazônia + 10 são fundamentais para estimular a participação das mulheres na ciência.

“As mulheres tendem a olhar o mundo com amplas perspectivas e abordagens, o que pode levar a soluções inovadoras e abrangentes. Termos mais mulheres na ciência traz uma mensagem de que estamos caminhando para uma sociedade mais justa e equitativa. Nesse sentido, torna-se importante incentivar a participação de meninas e mulheres na ciência, desde o ensino médio, e colaborar, na medida do possível, no debate envolvendo a promoção de políticas que favoreçam a participação da mulher na ciência”, propõe.

Andreia Brilhante realiza estudo sobre a ecoepidemiologia de doenças infecciosas em paisagens da região Amazônica sob efeito de desmatamento. Foto: acervo pessoal

Investimentos

O governo do Acre, por meio do Programa de Desenvolvimento Científico e Tecnológico Regional (PDCTR) da Fapac, em parceria com o Conselho Nacional de Desenvolvimento Científico e Tecnológico (CNPq), pagou quatro projetos de pesquisa para doutores, com valores de R$ 10 mil a R$ 40 mil, totalizando R$ 130,5 mil pagos pelo governo do Acre, além de bolsas DCR no valor de R$ 5,2 mil concedidas pelo CNPq a cada pesquisador, durante os 36 meses de duração do projeto.

O objetivo do PDCTR é fixar os pesquisadores doutores aprovados no Acre, sejam oriundos de outros estados do Brasil que podem se fixar em qualquer município do estado, sejam oriundos do Acre para fixação em municípios com exceção da capital, Rio Branco.

O programa Iniciativa Amazônia +10 pagou seis projetos de pesquisa para doutores, que foram R$ 200 mil da Fapac, pagos pelo governo do Acre e R$ 353,6 mil do CNPq, totalizando R$ 553 mil.

O objetivo dessa chamada de propostas foi apoiar a pesquisa científica e o desenvolvimento tecnológico em instituições de ensino e pesquisa e em empresas sobre os problemas atuais da Amazônia, com foco no estreitamento das interações na natureza – sociedade para um desenvolvimento sustentável e inclusivo da região.

Os pesquisadores se organizaram em rede de pesquisa de propostas com a participação de pelo menos três estados, sendo um deles obrigatoriamente da Amazônia.

O Programa Iniciativa Amazônia +10 – Chamada de Expedições Científicas efetuou o repasse de recursos para os dois projetos aprovados, que foram R$ 273,7 mil da Fapac pagos pelo governo do Acre e R$ 375,6 mil do CNPq e que juntos totalizam R$ 649,4 mil. 

Os dois pesquisadores aprovados assinaram o termo de outorga em 17 de fevereiro de 2025 e aguardam o repasse dos recursos que será realizado em breve pela Fapac.

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