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Dia das Crianças: 10 livros para aguçar a inteligência – 12/10/2024 – Era Outra Vez

Dia das Crianças: 10 livros para aguçar a inteligência - 12/10/2024 - Era Outra Vez

Bruno Molinero

Este Dia das Crianças é um pouco diferente para quem gosta de livros. Desde a pandemia de Covid-19, a Flip deixou de ocorrer em julho, como era tradicional, e passou a ser organizada cada vez num mês diferente do segundo semestre. Neste ano, a Festa Literária Internacional de Paraty está a todo o vapor agora, em outubro, no litoral do Rio de Janeiro. E, pela primeira vez, o Dia das Crianças coincide com um dos principais festivais literários do país.

No ano passado, este blog já falou sobre os gargalos da programação infantojuvenil da Flip —e pouca coisa mudou de lá para cá.

Seja como for, essa coincidência é uma ótima desculpa para fazer deste sábado, dia 12, uma data ainda mais literária. Por isso, abaixo há dez bons livros publicados recentemente para o público infantojuvenil. São obras que podem servir de ótimos presentes e também inícios de conversas com crianças e adolescentes e fagulhas para eletrificar a inteligência de meninos, meninas e adultos.

A seguir, saiba mais sobre os livros. A cobertura completa da Flip pode ser acompanhada aqui.

O Espaço Entre as Folhas da Relva

Não é exagero dizer que a chilena María José Ferrada está entre as autoras latino-americanas mais interessantes do momento. Sua obra vem sendo publicada pouco a pouco no Brasil, do premiado “Kramp” a livros ilustrados como “Meu Bairro”, “A Árvores das Coisas” e outros. Agora, chega a vez de “O Espaço Entre as Folhas da Relva”. Com subtítulo “Instruções para encontrar um poema”, a edição é uma espécie de manifesto poético para as infâncias e os adultos. Nela, Ferrada desloca a noção de que a poesia é a arte do sentimento e do eu —e cria uma poética que defende o campo da linguagem, do inesperado, do impossível, do estranhamento e da disrupção. “Faça um dicionário./ Só com palavras transparentes”, recomenda ela. “Guarde todas as folhas/ que caem das árvores durante uma hora./ Com elas, faça um livro./ E esconda na biblioteca/ da sua cidade”, diz mais adiante o texto.


Contos de Fadas da Irlanda

Não é tão comum que um vencedor do prêmio Nobel de Literatura tenha livros lançados para o público infantojuvenil. Mas esse é o caso do irlandês William Butler Yeats, vencedor do troféu em 1923. Na verdade, “Contos de Fadas da Irlanda” pode ser lido por crianças e adolescentes, mas também por adultos. Nessa coletânea, o poeta compila uma série de histórias da literatura tradicional e oral da Irlanda, trazendo personagens como o corcunda Dedente, fadas de todos os tipos, pessoas transformadas em gansos e outros seres fantásticos pouco conhecidos no Brasil. Enquanto os mais jovens se divertem com as aventuras e a fantasia, adultos são capturados pela relação entre a valorização da cultura popular irlandesa e a independência do país em relação ao império britânico, isso sem falar nas diversas referências espalhadas pelos textos, entre elas o clássico “Paraíso Perdido”, poema de John Milton.


Eu Penso Sempre em Você

Livros sobre a separação dos pais não são novidade na literatura infantojuvenil. Mas a nova parceria do escritor Leo Cunha com o ilustrador Salmo Dansa acrescenta um belo capítulo a essa produção ao apresentar uma fábula ao mesmo tempo delicada e cortante. Cunha conta em primeira pessoa a história de uma criança que toma uma série de medidas antes de visitar o pai, que agora mora em outra casa. Ela veste a saia que ganhou dele e não come muitos doces para não perder a fome, por exemplo. Tudo porque, caso contrário, “você pode ficar chateado”, repete ela várias vezes. Enquanto isso, Dansa aposta no fantástico e ilustra o conflito na forma de uma família de elefantes, com uma simpática elefantinha e seu pai carrancudo. “Por que vocês, adultos, se chateiam com coisas tão pequenas”, pergunta a menina, atando um nó na garganta de quem lê. “O que foi que eu fiz para você ficar tão sério?”, questiona ela.


A Morte É Assim?

Uma coisa é inegável —as crianças sempre fazem as melhores perguntas. E esse é o grande pulo do gato de “A Morte É Assim?”, estreia da editora Baião nos livros de não ficção. Nele, os autores compilam 38 perguntas sobre a morte feitas por crianças e adolescentes de várias partes do mundo. Para cada uma, há uma resposta ou pelo menos uma tentativa. Estão lá questões elementares como “Eu vou morrer?”, “O que existe depois da morte?” e “Por que os mortos são enterrados?”. Mas há também uma coleção de dúvidas fabulosas: “Antes de nascer eu estava morta?”, “É possível saber se nossos avós mortos têm sentimentos?”, “Morrer é má sorte?”, “Como saber se só dormi e não morri?”. Além da coragem de abordar um tema tão humano e tão tabu para a infância, a publicação cresce ainda mais ao não evitar tópicos delicados. Ela responde, por exemplo, “Por que há pessoas que se suicidam?”.


Duas Asas

Todos os dias de manhã, seu Guilherme levantava cedo, tomava café e “comia pão e as cores da aurora”. Só aí já dá para perceber o tom poético e sensível dessa história, publicada pelas italianas Cristina Bellemo e Mariachiara Di Giorgio. Nela, o protagonista um dia encontra um par de asas no jardim, bem abaixo do pessegueiro. Ele pergunta para os vizinhos se alguém perdeu aquele objeto, vai aos correios, quer saber quem deixou as asas dentro do seu quintal. Até que percebe que elas brotaram do jardim, perto de uma caixa cheia de lembranças. A narrativa joga a todo instante com essas metáforas e insere aqui e ali algumas brincadeiras de linguagem, com palavras que se unem, se misturam e formam expressões que desrespeitam a gramática e a ortografia. Até que certo dia seu Guilherme acorda, toma café, come pão com as cores da aurora e nota que as asas já estão maduras, prontas para o voo.


Lobo Mau com Dor de Dente

A editora Carambaia estreia na literatura para crianças com um personagem que habita esse universo há vários séculos: o lobo —mais especificamente, o Lobo Mau. Mas o autor, o brasileiro Daniel Kondo, consegue fazer algo especial. Ele dialoga com essa tradição, tira sarro dela e, ao mesmo tempo, nada contra a maré contemporânea de desconstrução desse personagem. De algum tempo para cá, as livrarias vêm recebendo uma variedade de obras que subverterem esse vilão, retirando-o da prateleira dos malfeitores e apresentando-o com medo, meio bonzinho, vítima do sistema opressor e outras coisas do tipo. Na história de Kondo, feita num formato vertical e alongado, o lobo está sofrendo com dor de dente. Por isso, aparecem porquinhos, cabritinhos e até a vovozinha para ajudá-lo a resolver esse problema. Não conto o final, mas é importante abrir o olho e ficar esperto. Nenhum lobo abre a boca à toa.


Lanche Noturno

“Lanche Noturno” até pode ser lido como uma fábula bonitinha, na qual animais se alimentam à noite. “Plim-plim, café quentinho. Cheiro bom no ar”, diz o texto logo no começo, quando uma carroça com uma coruja cozinheira aparece durante a madrugada no meio da cidade. Mas essa é só a superfície. É bom notar que a história se passa num ambiente urbano e que talvez tudo seja uma metáfora. Se for assim, quem são esses morcegos, raposas, texugos, gambás e outras espécies que vagam no escuro? O que querem esses seres famintos que se arrastam pela metrópole? Quantos deles nós enxergamos no nosso dia a dia? O que representa uma coruja que prepara um banquete para um ratinho que varre as ruas até tremer e ficar fraco? Nenhuma dessas questões tem uma resposta óbvia ou correta. Mas geralmente é mais importante fazer perguntas do que já chegar com as soluções prontas.


Certidão de Nascimento Poético

André Neves publica uma profunda homenagem à poesia neste livro, que serve como uma espécie de introdução a muitos movimentos literários e à obra de diferentes autores —mas sem ser didático nem enciclopédico. “Quando o poeta nasceu,/ um anjo bobo, meio tolo,/ veio soprar-lhe no rosto/ um ar de insignificante”, diz a obra, numa piscadela nada discreta a Carlos Drummond de Andrade. A partir daí, o título desfila versos rimados e brancos, estrofes metrificadas, palavras soltas, trava-línguas, estruturas típicas da poesia popular, haicais, palíndromos que fizeram a cabeça dos franceses do Oulipo, entre outras experiências poéticas que vão pipocando de maneira engenhosa. Embora não se arrisque numa poesia mais radical, que esfarela a linguagem, desmorona a palavra e dinamita a narrativa, “Certidão de Nascimento Poético” é uma elegante resposta para quem acha que criança não gosta de poesia.


As Interrupções

“A literatura não poderia existir se não existissem as moscas.” Essa frase da escritora mexicana Margo Glantz, infelizmente pouco conhecida no Brasil, abre este criativo livro dos argentinos Nicolás Schuff e Mariana Ruiz Johnson. Cheia de referências, que vão do palhaço assustador de “It” a Michel Foucault, essa metanarrativa tem início quando o escritor decide criar um conto, mas uma mosca aparece e acaba distraindo-o. A partir daí, surgem dinossauros, ladrões, detetives, ex-namoradas, a Chapeuzinho Vermelho e a própria avó do autor, que sempre diz: “Para que escrever sobre isso? Temos que seguir adiante”. A história vai se transformando ao longo das páginas, passando de um conto fantástico para uma trama policial, romântica, de terror e infantil, como se fosse um ensaio literário sobre os gêneros da literatura —mostrando com humor e nonsense como todos eles acabam sempre se misturando.


A Longa Caminhada de Jamil Fugindo da Guerra

No fim dos anos 1940, o alemão Theodor W. Adorno se questionou se seria possível fazer poesia depois de Auschwitz e da morte de 6 milhões de judeus na Segunda Guerra Mundial. A pergunta reaparece frequentemente desde então e ganha ainda mais força com os conflitos atuais, como na Ucrânia e no Oriente Médio —onde aproximadamente 11 mil crianças morreram apenas em Gaza, sendo que cerca de 700 delas eram bebês com menos de um ano, segundo dados da organização Save the Children. Como fazer literatura infantojuvenil nesse cenário? Moreira de Acopiara e Luciano Tasso apostam na poesia para contar a história de Jamil, homem que precisou fugir da Síria por causa da guerra, deixando para trás a mulher e o filho. O caminho povoado de soldados, mercenários, rostos tristes e barcos frágeis sobre o mar ecoa ainda mais neste momento, quando Israel bombardeia a Síria depois de atacar o Líbano e a Palestina.





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