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Exposições na Europa ampliam espaço do modernismo brasileiro na arte global – 21/12/2024 – Ilustríssima

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Exposições na Europa ampliam espaço do modernismo brasileiro na arte global - 21/12/2024 - Ilustríssima

Rafael Cardoso

[RESUMO] Exposições em cartaz na Suíça, sobre as origens do modernismo brasileiro, e na França, a respeito da obra de Tarsila do Amaral, revelam o momento propício da arte brasileira no exterior. O interesse pelo passado artístico do país, sustenta o autor, conflui com o esforço de abertura da história da arte ao âmbito global, processo acompanhado pela ampliação do espaço de artistas e curadores brasileiros na cena internacional.

A Bienal de Veneza foi o foco das atenções da arte nos últimos meses, em especial por ser a primeira vez que o evento foi dirigido por um curador brasileiro. O projeto de Adriano Pedrosa abriu espaço para três dezenas de artistas do Brasil. Juntos a sumidades vivas como Anna Maria Maiolino e Claudia Andujar, se alinharam expoentes históricos que incluem Eliseu Visconti, Yêdamaria, Ione Saldanha, Lina Bo Bardi, Maria Martins, Tomie Ohtake, Victor Brecheret e Waldemar Cordeiro.

Vários dos escolhidos evidenciaram as conexões entre o Brasil e a Itália —entre eles, nomes menos propalados, como Lorenzato, Danilo di Prete, Fulvio Pennacchi e Maria Polo. A curadoria de Pedrosa propôs uma revisão das figuras canônicas do Brasil, promovendo a inclusão de artistas mulheres, afrodescendentes e indígenas e de uma produção associada à arte popular.

Poucas vezes se expôs no estrangeiro tantos artistas do passado brasileiro. O fato não é, porém, de todo inédito. A exposição “Modernidade, Arte Brasileira do Século 20” —realizada no Museu de Arte Moderna de Paris em 1987 e 1988 com curadoria de Aracy Amaral, Frederico Morais, Marie-Odile Briot e Roberto Pontual— incluiu Lívio Abramo, Hélio Oiticica, Lygia Clark, Oswaldo Goeldi e Tarsila do Amaral.

Dez anos depois, em 1997, a Documenta X, sob a direção artística de Catherine David, alçou Hélio e Lygia a uma posição de centralidade na história da arte mundial do século 20, evidenciando as omissões do cânone eurocêntrico.

Entre 2001 e 2002, a megaexposição “Brasil: Corpo e Alma” transportou para o Guggenheim, em Nova York, desde a arte colonial até a contemporânea, passando pelo modernismo e pela arte concreta. A largueza do recorte levou o crítico da revista Artforum, um certo Adriano Pedrosa, então diretor do Museu de Arte da Pampulha, a escrever que “a imagem fragmentária e perversa do Brasil disseminada nessa exposição levará tempo para ser retificada”. O tempo passou, e o trabalho de retificação continua a todo vapor.

O ti-ti-ti em torno da Bienal de Veneza jogou sombra sobre duas exposições importantes em cartaz, uma na Suíça e outra na França, que buscam inserir a arte brasileira na história do modernismo internacional. Aberta em 7 de setembro no Centro Paul Klee, “Brasil! Brasil! O Nascimento do Modernismo” fica em Berna até o início de janeiro e segue para Londres, onde permanecerá em cartaz até 21 de abril na Royal Academy of Arts.

As datas de início e fim dessa itinerância podem sugerir uma dimensão nacionalista do projeto, mas não há envolvimento do Estado brasileiro. O apoio financeiro veio do governo suíço, que viabilizou os altos custos de transporte das obras do Brasil. Não são poucas: aproximadamente 130, a maioria de coleções particulares.

As curadoras da edição suíça da mostra (Fabienne Eggelhöfer, curadora do Centro Paul Klee, e Roberta Saraiva Coutinho, diretora do Museu da Língua Portuguesa) estão de parabéns por montar o quebra-cabeças dos empréstimos e por criar uma exposição elegante e convidativa, de espaços generosos e com exuberância na medida.

A exposição de Berna comporta dez artistas: Alfredo Volpi, Anita Malfatti, Candido Portinari, Djanira da Motta e Silva, Flávio de Carvalho, Geraldo de Barros, Lasar Segall, Rubem Valentim, Tarsila do Amaral e Vicente do Rego Monteiro, com um módulo para cada um e mais quatro módulos temáticos dedicados a literatura, música, arquitetura e design.

Além de obras bem conhecidas do público brasileiro, há outras pouco vistas, o que torna a mostra atraente até para especialistas no assunto. Entre as pérolas, estão “A Chinesa” (c. 1922), de Anita, “Mulher Diante do Espelho” (1922), de Vicente, “Mulato II” (c. 1924), de Segall, “Retrato de Ivone Levi” (1951), de Flávio de Carvalho, e “Arranjo de Três Formas Semelhantes Dentro de um Círculo” (1953), de Geraldo de Barros.

Pode despertar estranheza a inclusão de obras dos anos 1950 em uma exposição dedicada nominalmente ao nascimento do modernismo. Não para por aí. As décadas de 1960 e 1970 também comparecem com trabalhos de Djanira e Rubem Valentim.

A curadoria quis apresentar uma visão panorâmica do modernismo brasileiro, abarcando tanto sua formação quanto seus desdobramentos. Para quem conhece bem a história da arte brasileira, não deixa de ser perturbador ver a figuração de Djanira equiparada ao abstracionismo de Geraldo de Barros, como se houvesse diálogo possível entre formas plásticas que provocaram embates apaixonados em sua época.

Também causa incômodo se deparar com uma fotografia ampliada de vultos fundadores do samba moderno, âncora cenográfica do módulo sobre música, em convivência dócil com um meio erudito que renegou o modernismo do samba. As arestas da nossa história cultural são aparadas e suas asperezas, alisadas, propiciando ao olhar estrangeiro uma leitura complacente do modernismo brasileiro.

Em defesa do partido curatorial, vale ressaltar o tamanho do desafio. É intrincado o problema de introduzir um assunto vasto e controvertido para um público que ignorava sua existência. Por onde começar a narrar a história do modernismo brasileiro? Pela Semana de Arte Moderna de 1922? Entre especialistas, o consenso atual é que a importância da Semana foi superestimada nos últimos 50 anos. Como derrubar, no entanto, um mito em um meio em que ele nem sequer foi erigido?

Para o visitante suíço que talvez não tenha ideia que se fazia arte no Brasil antes do neoconcretismo, uma exposição concentrada nas décadas de 1910 e 1920 poderia ser hermética. Para transmitir uma primeira impressão, necessariamente larga, da arte brasileira do século 20, faz sentido abrir o diapasão para incluir manifestações posteriores. A partir daí, o problema passa a ser outro: não por quais razões ampliar o recorte, mas o que se exclui dele.

A crítica incontornável a “Brasil! Brasil!” reside em uma dessas exclusões. Por mais que se esquadrinhe o tema, não há argumento admissível para omitir Di Cavalcanti de uma mostra dedicada ao nascimento do modernismo no Brasil.

Outros nomes poderiam ter sido incluídos: Amílcar de Castro, Cícero Dias, Goeldi, Guignard, Iberê Camargo e Ismael Nery são artistas de primeira importância, mas nenhum deles é imprescindível para apresentar a modernidade artística como questão histórica. A não ser por Di Cavalcanti, um dos responsáveis pela Semana de 1922, o mais engajado politicamente dos artistas modernistas, principal elo do Brasil com o muralismo mexicano e, depois, inimigo número um do abstracionismo nos anos 1950.

Fazer uma exposição de modernismo brasileiro sem Di é equivalente a contar a história do cubismo sem Picasso. Nenhuma antipatia crítica justifica essa opção.

Assim como na Bienal de Veneza, as obras escolhidas para “Brasil! Brasil!” sugerem um propósito subjacente de adequar a arte brasileira do século 20 às sensibilidades políticas do século 21. Das muitas figuras afrodescendentes e indígenas em suas paredes, surge a impressão de um modernismo mais voltado para as lutas das populações subalternizadas do que, de fato, foi.

Afinal, os ditos mestiços, negros e índios retratados pelos pincéis de Portinari, Tarsila e Vicente são tipos e símbolos, mais que agentes da sua própria subjetividade. É verdade que o projeto curatorial aborda essa contradição nos textos de parede e no catálogo. A inclusão de Djanira e Rubem Valentim serve ainda como forma enviesada de compensar os clichês do nativismo modernista, contrapondo a ele outras visões.

Mesmo assim, a situação expositiva não provoca os confrontos necessários para uma verdadeira revisão histórica. Serena e arejada como a boa tipografia suíça, ela transige com narrativas que precisam ser desconstruídas.

Talvez seja esse o principal diferencial da exposição “Tarsila do Amaral: Pintar o Brasil Moderno“, inaugurada em outubro no Musée du Luxembourg, em Paris, onde fica até o início de fevereiro, seguindo para o Guggenheim Bilbao. Com curadoria de Cecilia Braschi, a mostra dá conta da dupla tarefa de (re)apresentar Tarsila a um público parisiense que a desconhecia e de contribuir para a revisão, atualmente em curso, da sua obra.

Desde a exposição, em 2017 e 2018, que ocupou o Art Institute, de Chicago, e o MoMA, em Nova York, a artista vem sendo assimilada progressivamente ao cânone mundial da arte moderna e galgado posições tanto por seu valor artístico quanto por ser uma mulher latino-americana, dado relevante neste momento em que se busca suprir lacunas e ampliar a história da arte para o âmbito global. Além do mais, com sua notória elegância, Tarsila cumpre os requisitos para ser encampada pela Chanel, grande mecenas do Musée du Luxembourg e apoiadora da mostra.

Dividida em seis módulos, a exposição compreende toda a trajetória de Tarsila, incluindo suas pinturas tardias, frequentemente desprezadas. Estão presentes muitas das obras mais conhecidas da pintora, mas também algumas raridades oriundas de coleções particulares, como “Figura em Azul” (1923) e “Cartão Postal” (1929).

“A Negra” (1923) ocupa posição central, destacada em uma parede onde a acompanham apenas dois desenhos a partir do mesmo motivo e um texto comentando a obra. É um tratamento exemplar para esse quadro tão controverso, em gritante contraste com sua colocação entre dois autorretratos na exposição “Tarsila Popular”, que ocupou o Masp em 2019.

Algumas obras fundamentais da artista não estão presentes, ou por impossibilidade de empréstimo (“Abaporu”) ou por figurarem na exposição na Suíça (“Morro da Favela”), mas as ausências são compensadas pela qualidade do conjunto.

O maior acerto da exposição do Musée du Luxembourg é a seriedade que empresta à artista. Tarsila não aparece exaltada por sua beleza e tampouco reduzida a seu apelo exótico. Nem musa nem primitiva, a “caipirinha vestida por Poiret” é despida das suas estratégias de consagração e revelada no árduo trabalho de construção de uma carreira no meio competitivo e machista da pintura moderna.

O projeto curatorial não aposta no partido ingênuo de deixar as obras falarem por si, mas antes lhes agrega os subsídios indispensáveis da história da arte. Uma riqueza de fotografias, documentos, estudos e textos permite ao visitante mergulhar na época, entender os propósitos da artista e os desafios, incluindo os políticos, que enfrentou.

Uma jornada de estudos em torno de “A Negra”, em novembro, e os seis ensaios do catálogo —ambos contaram com a minha participação— completam o esforço de cercar a recepção atual de Tarsila de uma devida compreensão do contexto em que viveu e produziu. Assim, sua obra é apresentada ao visitante de modo não só celebratório, mas como chave para repensar a história da arte moderna e suas relações com o Brasil.

Apesar das diferenças, as duas exposições dão sinais promissores da recepção futura do passado brasileiro. Não deixa de ser novidade que instituições estrangeiras importantes se interessem pela história da nossa arte sem investimento de empresas ou governos do Brasil.

O fato de ambas as mostras atraírem grande público e boa atenção midiática comprova ainda a falácia do argumento de que o passado artístico brasileiro não desperta interesse no exterior. Ao contrário, o momento nunca esteve tão propício.

Paralelamente à abertura da história da arte para o global, artistas e curadores brasileiros ocupam cada vez mais espaço na cena artística internacional. Parece que esses trânsitos no meio da arte contemporânea começam a render frutos para iluminar nossas origens culturais. Já não era sem tempo. Fica a esperança de que a arte brasileira obtenha cada vez mais o reconhecimento que merece.





Leia Mais: Folha

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Enfermeira que ajudou a dar à luz de bebê há 22 anos descobre que menina agora é sua nora

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A luta contra o câncer de próstata ganhou mais um aliado: um suplemento alimentar que promete combater as células doentes. É a vitamina K, encontrada em vegetais. - Foto: Freepik

Mary Ann, nunca imaginou que um recém-nascido que cuidou ao nascer teria um papel tão especial em sua vida. Anos depois, a enfermeira descobriu que Kelsey Poll, aquela bebê, que ela ajudou a dar à luz, se tornaria sua nora, ao se casar com o filho Tyler West.

Enquanto preparavam o álbum de casamento, Kelsey e Tyler encontraram uma foto que chamou atenção. Na imagem, Mary Ann segurava os pezinhos de Kelsey recém-nascida. Para Tyler, era claro: “Parecia que era para ser assim, desde que ela nasceu.”



A história viralizou nas redes sociais em 2024, emocionando milhares de pessoas. Hoje, o Só Notícia Boa relembra esse momento mágico que prova que o destino pode guardar surpresas incríveis.

Era pra ser só uma ida ao banco 

O destino conspirou de maneiras inimagináveis.

O filho de Mary Ann, Tyler, cruzou o caminho de Kelsey em um banco em que ela trabalhava.

Ele ia apenas depositar um cheque, mas se apaixonou pela moça do caixa.

E o encontro que parecia ser apenas casual acabou em um namoro e depois em casamento.

Ler mais notícia boa 

Mary acalmou a mãe de Stacy 

O casal enviou uma cópia da foto para todo mundo e não teve quem não ficasse chocado.

Na hora, Mary Ann ainda se lembrou do nascimento da pequena Stacy.

A mãe de Kelsey estava bem nervosa e ela ajudou a acalmá-la.

“Saber que eu estava segurando minha futura nora em meus braços, e agora aquele precioso bebê fará parte de nossa família para sempre…”, disse ela encantada.

Coincidência? 

Stacy ainda encontrou um certificado que a mãe recebeu após o nascimento dela com a caligrafia de Mary Ann West.

Acharam até vídeos da família e Mary juntos, celebrando a chegada dela.

“Há algumas coisas que são muito estranhas e fortes para serem uma coincidência e é exatamente assim que me sinto aqui”, acrescentou Stacy.

É muita coincidência ou destino, na sua opinião?

Foto de Kelsey quando bebê com a enfermeira Mary Ann West, que agora é a sogra dela. - Foto: reprodução/arquivo pessoal Foto de Kelsey quando bebê com a enfermeira Mary Ann West, que agora é a sogra dela. – Foto: reprodução/arquivo pessoal Toda a família reunida no casamento de Kelsey e Tyler. - Foto: Abbe White Photography Toda a família reunida no casamento de Kelsey e Tyler. – Foto: Abbe White Photography

Com informações de Inside Edition.



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O esforço de Rachel Reeves para melhorar os laços com a UE permanece limitado por linhas vermelhas | Heather Stewart Editora de Economia

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O esforço de Rachel Reeves para melhorar os laços com a UE permanece limitado por linhas vermelhas | Heather Stewart Editora de Economia

Heather Stewart Economics editor

Rachel Reeves procura uma “relação mais profunda e madura” entre o Reino Unido e a UE: esta foi a sua mensagem central aos ministros das finanças do bloco em Bruxelas, há duas semanas.

Nela breve discurso na reunião dos seus homólogos europeus – a primeira em que uma chanceler do Reino Unido participou desde o Brexit – Reeves mencionou o “relacionamento” do Reino Unido com a UE, nove vezes.

Além de mais profundo e maduro, ela deseja que seja mais próximo, mais forte, “maduro (de novo) e profissional” e “construído com base na confiança, no respeito mútuo e no pragmatismo”.

Poucos detalhes concretos surgiram da visita de Reeves a Bruxelas; mas quando um chanceler repete a mesma mensagem nove vezes, vale a pena tomar nota.

Com a estagnação da economia, fontes trabalhistas dizem que Reeves está a impulsionar cada vez mais o esforço para reduzir as barreiras comerciais com a UE – liderado formalmente a partir do Gabinete do Governo por Nick Thomas-Symonds.

Mujtaba Rahman, da consultoria Eurasia Group, um analista atento das reviravoltas do governo Brexit política, diz: “Penso que há uma perceção crescente, no Tesouro e não só, de que um comércio mais tranquilo com a UE é uma das poucas alavancas que podem utilizar para melhorar o crescimento a médio prazo”.

Além de procurar formas de obter melhores resultados económicos, a chanceler também espera aplacar os líderes empresariais, que continuam irritados com a sua situação. ataque fiscal orçamentário.

E nosso novo homem em Washington, Lord Mandelsoncomo antigo comissário do comércio da UE, provavelmente estará perfeitamente consciente dos possíveis conflitos entre qualquer coisa que o Reino Unido possa oferecer a Donald Trump e as perspectivas de uma redefinição da UE.

No entanto, é muito mais difícil discernir exactamente o que o governo do Reino Unido quer da UE – para irritação de Bruxelas e dos deputados trabalhistas pró-UE. “Existe um risco real de perdermos oportunidades, porque não somos claros sobre o que queremos”, alerta Stella Creasy, presidente do Movimento Trabalhista para Europaum grupo de pressão interno do partido.

Os ministros reafirmaram repetidamente as “linhas vermelhas” do Reino Unido, que incluem o não regresso ao mercado único ou à união aduaneira. E reiteraram as políticas do manifesto trabalhista sobre o Brexit, como a negociação de um acordo veterinário e a garantia do reconhecimento mútuo das qualificações profissionais.

Mas mesmo aqui, os interlocutores do Reino Unido parecem inseguros sobre o que exatamente estará em cima da mesa – e só agora é que o governo nomeia um intermediário com Bruxelas. (O ex-funcionário do Tesouro Michael Ellam, agora um banqueiro sênior, foi indicado para este trabalho pelo Financial Times – uma escolha que provavelmente agradará ao seu antigo departamento.)

Há alguns indícios de que o governo pode estar preparado para ir além do que o manifesto pede, onde poderá fazê-lo com as linhas vermelhas intactas.

No entanto, se o Partido Trabalhista quiser fazer progressos na cimeira UE-Reino Unido marcada para Fevereiro e posteriormente, a UE deixou bem claro que quer discutir um esquema de mobilidade juvenil. Os ministros rejeitaram repetidamente essa ideia, sugerindo por vezes que seria equivalente à livre circulação.

Apesar de uma vez afirmar ele queria ver o retorno da livre circulação com a UE, Keir Starmer tinha boas razões para a excluir como política laboral – e com ela, portanto, a adesão ao mercado único.

A preocupação com a migração descontrolada e o seu impacto nos empregos e nas comunidades fez claramente parte da motivação para a votação do Brexit, e a relevância da questão entre os eleitores continua elevada. No entanto – e nem seria necessário dizê-lo – um regime de mobilidade recíproca e limitado no tempo dos jovens não é a mesma coisa que livre circulação irrestrita.

A proposta inicial da UE previa que um número ilimitado de jovens entre os 18 e os 30 anos pudessem vir até quatro anos, mas isso é um ponto de partida: o governo poderia certamente defender algo mais definido.

E não deveria ser impossível aos políticos conceber um esquema que ajudasse os jovens do Reino Unido a obter aprendizagem, formação e estágios profissionais na UE, além de permitir o estereótipo do ano sabático dos filhos ricos.

Mas Starmer minou a sua própria capacidade de defender tal esquema com os seus recentes pronunciamentos sobre a migração, que o envolveram de forma estridente acusam os Conservadores de uma “experiência de fronteiras abertas”.

O resultado líquido do actual sistema ao longo dos últimos anos – incluindo a decisão de criar vistos de saúde e de assistência social para ajudar a resolver a escassez de mão-de-obra – foi uma migração líquida recorde, com um pico extraordinário de 906.000 no ano passado.

Mas a fronteira definitivamente não está “aberta”. Você só pode vir legalmente para o Reino Unido para trabalhar se tiver um empregador para patrociná-lo e um emprego para onde ir; pagar uma alta taxa de visto e um sobretaxa anual do SNS de £ 1.035 por ano; e se enquadram em uma série de outros critérios.

As regras podem ter sido demasiado frouxas e, sem dúvida, muito pouco foi feito para desenvolver internamente o nosso próprio talento, uma política de fronteiras abertas, não é – ao agrupar todos os migrantes, incluindo aqueles que foram recrutados para preencher lacunas na difícil situação. pressionado o NHS e os setores de cuidados, como parte de uma “experiência”, Starmer presta-lhes um péssimo serviço.

Foi o medo corrosivo do Partido Trabalhista em relação a Nigel Farage e à Reforma que moldou a retórica do governo aqui; mas poderá dificultar a sua própria vida, se mais tarde tiver de defender algumas concessões à UE em matéria de mobilidade juvenil.

As intervenções de Reeves sobre a Europa nas últimas semanas podem ser interpretadas como o início de um esforço determinado para defender publicamente uma relação mais estreita, mesmo quando isso signifique perturbar os conservadores do Brexit. Isso parece, como ela disse, “maduro”.

Mas para que o argumento se mantenha, o Partido Trabalhista também terá de levar em conta a sua relação controversa com a migração.



Leia Mais: The Guardian



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Estou vivendo minha própria Nakba | Opiniões

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Estou vivendo minha própria Nakba | Opiniões

O meu avô, Hamdi, tinha apenas oito anos quando a sua família fugiu de Bir al-Sabaa, uma cidade no sul da Palestina que já foi conhecida pelas suas terras férteis e pela vida agrícola. O seu pai, Abdelraouf, era um agricultor que possuía cerca de 1.000 dunams de terra e cultivava trigo, vendendo a colheita a comerciantes em Gaza. A família teve uma vida feliz e confortável.

Em Outubro de 1948, vários meses depois de as forças sionistas europeias terem proclamado a criação de Israel, as tropas israelitas atacaram Bir al-Sabaa, forçando milhares de palestinianos, incluindo a família do meu avô, a fugir sob a ameaça de serem massacrados.

“Fugimos de Bir al-Sabaa quando as milícias chegaram”, dizia-me frequentemente o meu avô. “Meu pai pensou que seria apenas temporário. Deixamos nossa casa, terra e animais para trás, pensando em voltar. Mas isso nunca aconteceu.”

A família de Hamdi fugiu a pé e em carroça puxada por cavalos. O que eles pensavam que seriam algumas semanas de deslocamento transformou-se em exílio permanente. Tal como outros 700 mil palestinos, eles foram sobreviventes do que hoje chamamos de Nakba.

A família de Hamdi encontrou refúgio em Gaza, onde permaneceu em abrigos temporários e com familiares alargados. Parentes ajudaram-nos a comprar um pequeno terreno no bairro de Tuffah, em Gaza, a apenas 70 quilómetros da sua casa em Bir al-Sabaa, que os israelitas rebatizaram de Beersheba. A família de Hamdi lutou para reconstruir a sua vida.

Setenta e cinco anos depois da experiência dolorosa de deslocamento, tristeza e luta para sobreviver do meu avô, minha família e eu também fomos vítimas da Nakba.

Às 4h do dia 13 de outubro de 2023, o telefone da minha mãe tocou. Estávamos todos dormindo em um quarto de nossa casa, no bairro de Remal, na cidade de Gaza, tentando encontrar conforto no som implacável de drones e aviões de guerra no alto. O telefone acordou todos nós.

Era uma mensagem pré-gravada dos militares israelitas avisando-nos de que a nossa casa estava numa zona de perigo e que estávamos a receber ordens de nos deslocarmos para sul. O medo tomou conta de nós enquanto corríamos para fora, apenas para ver folhetos israelenses espalhados por toda parte com o mesmo aviso. Não tivemos escolha a não ser arrumar algumas roupas e roupas de cama e fugir.

Não foi a primeira vez que fomos forçados a sair de casa. Desde os 12 anos que experimentei o horror dos ataques israelitas a Gaza, que repetidamente nos forçaram a fugir e a viver no medo e na incerteza.

Desde os 12 anos aprendi a reconhecer os sons distintos de bombas, jatos F-16, helicópteros Apache e drones. Conheço intimamente o terror que eles trazem.

As deslocações anteriores foram temporárias e esperávamos que esta também o fosse – tal como o meu avô acreditava que a sua família acabaria por regressar.

Mas não há retorno à vista agora. A nossa casa foi gravemente danificada por um tanque israelita. O andar superior foi queimado e falta uma parede inteira no andar inferior. Todos os nossos pertences foram destruídos.

A bolsa com algumas roupas que levei no dia 13 de outubro é tudo o que resta dos meus pertences.

Fomos para az-Zawayda, no centro da Faixa de Gaza, para ficar com parentes. Ao longo do caminho, vimos milhares de outros palestinos arrastando sacos de roupas e em busca de segurança.

Do nosso abrigo temporário, vi a dor do exílio nos cantos lotados de cada quarto. Dividíamos um apartamento com outras 47 pessoas, presos pelo medo arrepiante de que nenhum lugar era seguro. Passamos dois meses naquele apartamento lotado, perto da rua Salah al-Din. No final das contas, explosões constantes nos forçaram a nos mudar para outra casa na região.

Em 5 de janeiro, o estalo agudo de tiros de franco-atiradores e tiros se intensificou. Então veio a explosão estrondosa de artilharia e bombas. Reunimos o pouco que tínhamos e fugimos para Deir el-Balah.

Fomos forçados a viver numa tenda para oito pessoas durante três meses antes de nos mudarmos para um quarto pequeno e mal isolado num terreno de propriedade de um amigo. É aqui que passaremos o inverno. A chuva penetra pelas janelas de náilon e o frio é insuportável, deixando-nos sem dormir na maioria das noites.

Temos lutado para garantir as necessidades mais básicas – comida e água. Nos últimos dois dias, fomos forçados a sobreviver com água contaminada e um único pão. A fome esgotou a nossa força e esperança.

Agora compreendo a Nakba de 1948 de uma forma que nunca compreendi antes. É a história que os meus avós repetem na nossa geração, mas dentro dos limites de Gaza. E, para ser honesto, é ainda pior do que a Nakba de 1948. As armas utilizadas hoje são muito mais avançadas, causando uma destruição sem precedentes e mortes e ferimentos em massa – algo que os meus avós nunca poderiam ter imaginado em 1948.

A dor não é apenas física. Também é psicológico. Testemunhar o impensável – o medo constante, a perda de entes queridos, a luta pela sobrevivência básica – teve um custo enorme. Durante as noites sem dormir, o barulho ensurdecedor dos foguetes e as memórias de corpos desmembrados e casas em ruínas nos assombram. Olho para os membros da minha família e vejo o quanto seus rostos mudaram; seus olhos vazios e lágrimas silenciosas falam por si. Quando caminho pelas ruas, vejo comunidades conhecidas pela sua generosidade e solidariedade, destruídas pela perda e pela destruição.

É claro que o objectivo de Israel é forçar a saída dos palestinianos da Palestina histórica por qualquer meio. O medo de ser expulso de Gaza é esmagador. Com as casas reduzidas a escombros e bairros inteiros destruídos, parece que o nosso exílio pode ser iminente. Nunca imaginei sair de casa, mas depois de perder tudo, Gaza já não parece um lugar para viver – apenas um cemitério de desespero e perda.

Não há palestino que não tenha sido afetado pelo deslocamento, pelo medo de perder a pátria para sempre. A Nakba é verdadeiramente a história interminável da Palestina.

As opiniões expressas neste artigo são do próprio autor e não refletem necessariamente a posição editorial da Al Jazeera.



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