O novo marco regulatório dos fundos de previdência complementar torna essas soluções de investimento mais atrativas e ajustáveis às realidades dos investidores. As mudanças constam em duas resoluções do Conselho Nacional de Seguros Privados (CNSP), publicadas em fevereiro deste ano, relativas ao Plano Gerador de Benefício Livre (PGBL) e ao Vida Gerador de Benefício Livre (VGBL). As medidas foram regulamentadas pela Susep em duas circulares, a 698/2024 e a 699/2024, divulgadas em abril.
Os produtos de previdência têm duas etapas: a de acumulação, quando são realizados os aportes que, ao longo do tempo, formarão o montante, e a de benefício ou renda. As novas regras trazem mais flexibilidade na fase de usufruto. Anteriormente, a escolha da forma de receber o benefício era feita no momento da contratação do plano. Agora, essa decisão passa a ser tomada próxima à fruição. A inovação mais significativa é que o investidor ganha mais liberdade para compor seu ciclo de rendas.
“O regulador traz mais possibilidades para que as pessoas possam adequar essa solução financeira de longo prazo às suas reais necessidades e circunstâncias de vida”, afirma Carlos Eduardo Gondim, diretor estatutário da Federação Nacional de Previdência Privada (Fenaprevi). Na visão dele, as novas regras devem impulsionar o setor de previdência privada, após período de adaptação das ofertas de produtos e de conscientização dos investidores.
Segundo especialistas, as novas regras evitam situações complexas como jovens em torno de 20 anos de idade terem que definir seus futuros, durante contratações de planos muito cedo. “As finanças comportamentais indicam que decisões difíceis tendem a ser postergadas devido à incerteza sobre as suas consequências. Portanto, a nova regra, que transfere essa escolha para a hora de usar o benefício, é um avanço e estimulará os investidores”, avalia Amâncio Paladino, diretor da XP Vida e Previdência.
Quanto às possibilidades de ciclo de rendas, em um exemplo hipotético, uma pessoa que se aposenta de um emprego CLT pode optar pela conversão parcial de renda mensal do seu plano privado por um período, mantendo parte do saldo para imprevistos. Caso inicie um empreendimento, pode reduzir a renda mensal temporariamente até recuperar a estabilidade financeira e retomar os aportes, planejando a fase em que realmente deixará de trabalhar, com outro tipo de renda, pensando até em reversão a beneficiários indicados em caso de sua morte. Em termos práticos, após a acumulação de recursos, os investidores podem optar pelo pagamento único do benefício, ou escolher entre alternativas de renda – podendo combiná-las.
No mercado, as principais são a renda mensal vitalícia, que é um benefício pago mensalmente por toda a vida do participante e pode ser ou não reversível a um beneficiário indicado, e a renda por prazo certo, que é paga mensalmente por um prazo definido e, com a morte do participante, o beneficiário indicado segue recebendo até o término desse prazo.
Já na renda mensal temporária, o benefício é pago mensalmente por um prazo determinado pelo participante, entretanto, se ele vier a morrer antes, o pagamento é cessado, ou seja, as parcelas restantes não vão a um beneficiário.
Ainda pelas novas regras, os participantes poderão contar, para o cálculo das rendas, com índices ou taxas de juros mais alinhadas aos praticados no mercado na ocasião dos desembolsos. “Passará a existir no país um mercado de rendas, ou seja, o investidor poderá fazer a cotação em várias seguradoras e transferir os recursos para aquela que oferecer a melhor condição”, explica Paladino.
Carlos Eduardo Gondim, da FenaPrevi, acrescenta que as rendas também podem ser em cotas. “Por exemplo, eu posso ver quanto meu fundo está rendendo e ter minha renda em cotas, com variações ao longo do tempo”, afirma.
Quanto aos planos de previdência coletivos – oferecidos por empresas -, haverá uma cláusula de adesão automática dos participantes. Até então, os novos colaboradores precisavam manifestar interesse em aderir. “A adesão automática é uma facilidade porque tem muita gente que, por falta de conhecimento, não faz e acaba perdendo o benefício. É um estímulo para que as pessoas possam experimentar”, diz Gondim. No entanto, quem não quiser, pode optar pela saída.
Sandro Bonfim, superintendente de Produtos da Brasilprev, ressalta que o novo marco regulatório é positivo, foi amplamente debatido com representantes do mercado e está dentro de um contexto ainda maior de modernização de previdência privada. Ele destaca a lei 14.803/24, sancionada em janeiro, que permite que os participantes dos planos PGBL e VGBL escolham o regime de tributação (tabela progressiva ou regressiva de alíquotas do Imposto de Renda) no primeiro resgate ou no momento de obtenção do benefício. Antes, essa decisão precisava ser tomada logo na adesão. “Essa é outra flexibilidade importantíssima para o planejamento financeiro”, diz.
Outro pilar relevante, de acordo com Bonfim, é a lei 14.652/23, que permite o uso de previdência complementar como garantia em operações de crédito, o que beneficia muitas pessoas que precisam de recursos para alguma necessidade ou eventualidade no dia a dia, desde que com planejamento adequado. “Usar o investimento como garantia viabiliza acesso a crédito mais barato, com manutenção da reserva de longo prazo das pessoas. Essa lei teve apoio grande do Ministério da Fazenda por esse processo virtuoso de melhoria do crédito”, afirma o superintendente da Brasilprev.