POLÍTICA
O oftalmologista e a política: O oftalmologista
PUBLICADO
3 horas atrásem
Edison Veiga
Ele faz perguntas. Ele quer entender.
Ele faz perguntas incômodas. Ele quer entender coisas que são difíceis de explicar.
Principalmente, ele não tem a experiência brasileira no traquejo do entendimento do inexplicável. Austero e sisudo, quase sem emoções, ele não iria compreender um meme, ele jamais saberia a dor e a delícia de fazer piada com a desgraça. No caso, a nossa própria desgraça.
Meu oftalmologista esloveno gosta de política e, ao menos esta é a parte que transparece para mim, parece nutrir uma predileção especial pela política brasileira. Da última vez em que lá estive, quase dois anos atrás, tive de explicar para ele por que raios dias depois das eleições algumas pessoas vestidas de amarelo estavam rezando e cantando o Hino Nacional para um pneu. Tentar explicar.
Suei frio para responder. Tentei fazer troça, ele insistiu que queria uma resposta. Usou aqueles argumentos rasos, do tipo: você que é brasileiro precisa me explicar. E o outro, mais raso ainda: você que é jornalista precisa me explicar.
Ele faz perguntas e quer entender. Eu sou um aprendiz de explicador.
Já estou sofrendo por antecipação porque tenho consulta agendada com ele em dezembro. Sinto calafrios noturnos, padeço de insônia. Estou treinando respostas na frente do espelho. Ele vai me encher de perguntas, talvez a consulta demore duas horas.
Como vou explicar para ele essa história de planejarem matar o presidente, o vice, um ministro do STF? Nem desenhando. Conto também que teve homem-bomba na Praça dos Três Poderes? Talvez corra o risco de me complicar demais nas tentativas de explicação…
Falo para ele que teve cadeirada na corrida eleitoral de São Paulo? Existe tradução para cadeirada, meu-deus-do-ceuzinho? Vou ter de contar que a campanha à prefeitura da maior cidade do meu país teve direito até a atestado falso com erros de digitação assinado por médico que já morreu. Ele vai ficar espantado, talvez me pergunte se a bandidagem no Brasil é toda amadora assim ou se há organizações mais profissionais. Nessa hora eu já tenho um plano: vou pedir para tentar ler de novo aquela linha das letrinhas mais miúdas, aquela que nunca consigo por causa da minha miopia na casa dos dois dígitos.
Ele vai querer saber do Rio Grande do Sul, dos alagamentos históricos. Mas vai puxar pelo lado político, talvez me pergunte como o prefeito de Porto Alegre conseguiu ser reeleito mesmo não tendo feito a manutenção das comportas prometida em campanha quatro anos atrás.
As queimadas também serão assunto, porque já o foram da outra vez. Ele vai querer saber como o problema continua, se ninguém está fazendo nada, se não há nada que possa ser feito, se há criminosos por trás ou se é tudo culpa da natureza. Eu vou tentar distraí-lo mudando de assunto: será que vai nevar muito neste inverno?
Mas ele voltará a questões ambientais. Vai querer saber se é verdade que as empresas envolvidas no caso da tragédia de Mariana, em 2015, acabaram de ser absolvidas. Vai me perguntar se é isso mesmo ou se foi algum erro de tradução de quem publicou esta notícia por aqui. Eu vou fazer um hã hã, serei obrigado a admitir que é verdade.
Vou até pensar se vale a pena enxergar bem
Ele vai falar do 8 de janeiro, tenho certeza. No mínimo vai usar alguma expressão meio “a invasão do Capitólio versão brasileira” ou coisa assim. Vai rir quando eu disser que alguns conseguiram fugir para a Argentina.
Como gosta de arte e é fã do Niemeyer, certeza que vai ficar indignado com a depredação do patrimônio, com a destruição de obras, com os danos a itens como As Mulatas, do Di Cavalcanti, ou A Bailarina, do Brecheret.
Vai me interrogar a partir de axiomas. Ou semi-axiomas, porque são verdades que parecem não funcionar no Brasil. “Mas como alguém se diz defensor da pátria e depreda os símbolos desta mesma pátria?” Vou responder que não sei. Vou ensaiar já um sorriso amarelo. Verde e amarelo.
Ele vai perguntar por que a primeira-dama falou o que não devia para o Elon Musk. Vai emendar dizendo “tudo bem, eu também não gosto do Musk, mas se o cara vai ter cargo no governo americano, essas fagulhas institucionais não caem bem”. Vou só balançar a cabeça.
Talvez ele queira continuar o papo da última consulta, sobretudo no tema “medidas sanitárias”, afinal ele é médico. Desta vez não falaremos sobre a negação do uso de máscaras no auge da pandemia ou a recusa em ser um dos primeiros a adquirir vacinas, tópicos estes já exaustivamente discutidos e esgotados dois anos atrás. Mas ele pode vir com “e a ozonioterapia, hein?!”, só para me dar a oportunidade de dizer que, sim, o governo federal sancionou no ano passado uma lei que autoriza a prática dessa pseudoterapia em território nacional.
Vai me perguntar se eu não acho irônico que um ministro responsável pelos Direitos Humanos tenha caído justamente por denúncia de assédio. Se sobrar tempo, ele ainda vai querer saber como anda o caso das joias envolvendo o ex-presidente Bolsonaro. Vai comentar que finalmente prenderam os suspeitos de mandar matar Marielle. Vai tergiversar um pouco, talvez brinque que a seleção brasileira não convence mais, aí vai voltar a falar desse plano de matar o presidente eleito, dar um golpe, acabar de vez com a democracia…
Voltaremos à estaca zero do início da consulta, vou tentar encerrar. Dói tudo, doutor. Dói tudo falar sobre meu país assim. Estou vulnerável, o consultório é seu, não gosto muito desse clima.
Então ele vai prescrever meus novos óculos e eu vou sair de lá pensando se vale mesmo a pena enxergar bem.
Siga o autor nas redes sociais:
Facebook
X (ex-Twitter)
Instagram
Threads
BlueSky
Relacionado
VOCÊ PODE GOSTAR
POLÍTICA
Toffoli confirma grampo ilegal da Lava-Jato contra…
PUBLICADO
16 minutos atrásem
21 de novembro de 2024Pedro Pupulim
O ministro Dias Toffoli, do STF, confirmou, em decisão desta quinta-feira, que autoridades policiais instalaram grampo ilegal na cela de Alberto Youssef, na carceragem da PF no Paraná, onde o doleiro esteve detido em 2014, na primeira fase da Lava Jato. A decisão decorre de um pedido feito pela defesa de Youssef em setembro de 2023, no qual os advogados pedem que o hoje senador Sérgio Moro (União Brasil-PR), à época juiz titular da 13ª Vara Federal de Curitiba, seja investigado pela instalação do grampo. O sigilo do documento, no entanto, foi levantado pelo ministro nesta manhã.
Além da confirmação da instalação ilegal dos equipamentos, o ministro determinou o envio do pedido e dos documentos relacionados ao caso à PGR, AGU, CGU, TCU, ao Ministério da Justiça, à Diretoria da Polícia Federal e à Presidência do Congresso Nacional para que procedam com as providências que entenderem cabíveis.
Em sua decisão, Toffoli também observou que o MPF investigou cinco delegados e um agente da PF por terem supostamente feito parte da “operação” que instalou os equipamentos na cela do doleiro. O órgão, contudo, não teria encontrado indícios de crime por parte desses investigados e pediu o arquivamento do caso. O engavetamento foi deferido pelo juízo da Vara Federal, e não houve recurso dessa decisão.
Histórico
Como mostrou o Radar, a autorização para acessar os dados do processo que investiga a escuta clandestina foi concedida à defesa de Youssef em julho deste ano pelo juiz substituto da Justiça de Curitiba, Guilherme Roman Borges. A defesa do doleiro também informou que a mídia sempre esteve guardada na secretaria da Vara, e esse fato foi “estranhamente” omitido dos juízes que substituíram Moro, o que acabou por atrasar em mais de um ano o acesso aos áudios.
Mas, segundo Toffoli, a apuração administrativa da 13ª Vara Federal não deixa dúvidas de que a captação ambiental ilícita de diálogos de fato ocorreu, envolvendo Youssef e outras pessoas que interagiram com ele enquanto esteve na carceragem da PF em Curitiba. Para isso teriam sido usados equipamentos pertencentes ao patrimônio da União.
Em razão disso, o ministro determinou o envio da PET e dos documentos à Procuradoria-Geral da República (PGR), à Advocacia-Geral da União (AGU), à Controladoria-Geral da União (CGU), ao Tribunal de Contas da União (TCU), ao Ministério da Justiça, à Diretoria da Polícia Federal e à Presidência do Congresso Nacional. Caberá a essas autoridades e instituições tomar as providências que entenderem cabíveis.
Relacionado
POLÍTICA
Paulo Pimenta fala sobre reação do governo ao plan…
PUBLICADO
47 minutos atrásem
21 de novembro de 2024 Victória Cócolo
O programa Ponto de Vista, de VEJA, desta quinta-feira, 21, entrevista o ministro-chefe da Secretaria de Comunicação Social da Presidência da República, Paulo Pimenta, para falar sobre os primeiros dias após o governo tomar conhecimento do plano de militares de assassinar o presidente Lula e dar um golpe em 2022.
Na operação da Polícia Federal realizada terça-feira, 19, quatro militares e um agente da própria PF foram presos, incluindo o ex-secretário-executivo da Secretaria-Geral da Presidência no governo Jair Bolsonaro, general Mario Fernandes.
Ainda de acordo com a PF, um plano com detalhamento operacional, chamado de “Punhal Verde Amarelo”, foi identificado e seria executado no dia 15 de dezembro de 2022, data em que a chapa Lula Alckmin já havia sido eleita pelo voto popular.
Sobre o programa
O Ponto de Vista é apresentado por Marcela Rahal, transmitido ao vivo às 12h, e também trata das principais notícias do dia.
Você pode participar mandando sua pergunta em nossas redes sociais ou pelo chat.
A entrevista é transmitida simultaneamente no YouTube e na homepage da VEJA, e para os inscritos no canal da VEJA no WhatsApp.
YouTube: https://www.youtube.com/c/veja
Inscreva-se nos canais da VEJA nas redes sociais e fique por dentro de tudo sobre o novo programa.
Facebook: https://www.facebook.com/Veja/
Instagram: https://www.instagram.com/vejanoinsta/
Leia mais sobre o Ponto de Vista e sobre os bastidores da política nacional:
Relacionado
POLÍTICA
Deputados podem apadrinhar emendas de ex-colegas p…
PUBLICADO
2 horas atrásem
21 de novembro de 2024 Nicholas Shores
A Câmara aprovou na terça-feira projeto com novas regras para a indicação e a execução da verba das emendas parlamentares ao Orçamento. O texto, destinado a cumprir exigências do STF por transparência e rastreabilidade, foi à sanção do presidente Lula.
Como as mudanças só valem daqui para frente, contudo, o Congresso vai precisar adotar medidas adicionais para atender à determinação do Supremo de dar publicidade total à autoria e à destinação das emendas de 2020, 2021 e 2022.
Autor do projeto de lei complementar 175 de 2024, aprovado na terça, Rubens Pereira Júnior (PT-MA) afirmou que, como solução, deputados poderiam “apadrinhar” emendas indicadas por ex-colegas que não estão mais na Câmara e passar a responder pelo rastreamento e pela execução da verba.
Foi no período de 2020 a 2022 que as emendas de relator deram origem ao chamado “orçamento secreto” e se tornaram a modalidade predileta de negociação no Congresso, somando 45,7 bilhões de reais em repasses em três anos sem qualquer transparência sobre a autoria e o critério da aplicação do dinheiro.
Agora, segundo Pereira Júnior, a Câmara já conseguiu mapear cerca de 70% dos deputados e senadores que indicaram o destino dessas emendas. Os registros, até o momento não públicos, estão chegando na forma de ofícios de parlamentares ao governo Bolsonaro ou de planilhas mantidas por líderes de bancadas.
Quando a Câmara tiver reunido todas as informações, vai disponibilizá-las no Portal da Transparência. O Senado passa pelo mesmo processo.
Relacionado
PESQUISE AQUI
MAIS LIDAS
- MUNDO5 dias ago
Justiça impõe limites a tropa de choque de presídios em SP – 15/11/2024 – Mônica Bergamo
- BOA SORTE7 dias ago
Aviator: Descubra o Segredo para Jogar e Ganhar no Jogo do Aviãozinho
- MUNDO4 dias ago
Procurador-geral de Justiça de Minas organiza evento em Bruxelas – 16/11/2024 – Frederico Vasconcelos
- MUNDO6 dias ago
Miss África do Sul sai do Miss Universo por problemas de saúde – DW – 15/11/2024
You must be logged in to post a comment Login