José Henrique Mariante
Um dia depois de demitir o ministro das Finanças e implodir a coalizão que sustentava seu governo, Olaf Scholz passou a ser pressionado pela oposição a acelerar a convocação de novas eleições na Alemanha. O chanceler não é obrigado a fazer isso, e o impasse promete acirrar ainda mais a crise política na maior economia da Europa.
Na noite de quarta-feira (6), após uma série de reuniões infrutíferas, Scholz anunciou a dispensa de Christian Lindner, maior patente do FDP, o partido liberal que compunha o semáforo —apelido da coalizão, que ainda tinha os Verdes e os sociais-democratas do SPD, a sigla do primeiro-ministro.
A ruptura se desenhava há dias, desde que Lindner e o ministro da Economia e vice-chanceler, Robert Habeck, entraram em rota de colisão pela condução econômica do país. Os dois lançaram planos unilaterais de recuperação, absolutamente antagônicos.
Em discurso, Scholz fez duras críticas a Lindner, surpreendeu com uma referência explícita à eleição de Donald Trump nos EUA e afirmou que se submeteria a um voto de confiança do Parlamento em janeiro. Derrotado nessa votação, o que é provável, o chanceler abriria caminho para antecipar as eleições de setembro para março de 2025.
Pouco antes de se encontrar com Scholz, nesta quinta-feira (7), o líder da oposição, Friedrich Merz, da CDU, afirmou a jornalistas que o cronograma proposto não fazia sentido e que o voto de confiança deveria ser submetido ao Parlamento em no máximo duas semanas. “Não há motivos para adiarmos isso. O governo acabou”, declarou o conservador.
De acordo com a imprensa alemã, o encontro, como esperado, não produziu resultados,
Scholz alega que o país precisa debater e aprovar primeiro projetos importantes, como o Orçamento de 2025, medidas de fortalecimento para a economia, que patina há dois anos e agora terá as prometidas tarifas de Trump pela frente, assim como o pacote de suporte à Ucrânia.
Merz e a CDU aparecem à frente nas pesquisas de intenção de voto, o que confere à sua exigência um certo aspecto eleitoreiro. A legislação alemã, porém, deixa o rito nas mãos do chanceler, justamente para desestimular investidas oportunistas de tomada de poder, uma herança dos tempos de guerra. Seria necessário que a oposição agregasse uma maioria em favor de um candidato a primeiro-ministro, algo que parece improvável no Parlamento atual.
Agora ou em janeiro, após o voto de confiança, cabe ao presidente do país, Frank-Walter Steinmeier, convocar as novas eleições, medida protocolar, mas que ele toma a partir de sua percepção de governabilidade do país. “O fim de uma coligação não é o fim do mundo”, disse o mandatário, em apoio a Scholz. “É hora de razão e responsabilidade.”
A AfD, a ascendente sigla de extrema direita da Alemanha, também pediu a aceleração do processo. Seu desempenho nas pesquisas é superior ao dos partidos da coalizão. Confia também no propalado efeito que o sucesso de Trump nos EUA possa ter sobre o humor dos eleitores alemães, ávidos por mudanças.
A maior economia da Europa, estagnada há dois anos e com infraestrutura defasada, enfrenta uma guerra tarifária com a China e deve ser uma das mais penalizadas pela segunda administração Trump, que promete sobretaxar produtos, principalmente carros, produto de exportação por excelência da Alemanha.
A intransigência de Lindner, que provocou os integrantes da coalizão no fim de semana com uma proposta de choque neoliberal, com corte de gastos e fim de subsídios, foi entendida como temerária por alguns analistas políticos. Das três siglas, o FDP tem a situação mais frágil do ponto de vista eleitoral.
Um dos ministros da cota do partido no governo inclusive pediu para continuar no gabinete e anunciou sua saída da legenda. Além de continuar na pasta de Transportes, Volker Wissing vai acumular a Justiça, que também estava com o SPD.