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Partidos com maiores fatias do orçamento secreto s…

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Partidos com maiores fatias do orçamento secreto s...

Marcela Mattos

Em meio a uma pequena multidão no interior do Amapá, o ministro Waldez Góes, da Integração e do Desenvolvimento Regional, tomou a dianteira montado em uma bicicleta e saiu ziguezagueando entre uma tropa que chacoalhava bandeiras para o alto. O líder do governo no Congresso, senador Randolfe Rodrigues, se protegia do calorão com um boné que levava o nome e o número do seu candidato na região e atenciosamente parava para distribuir fotos e abraços. Enquanto isso, o governador Clécio Luis se misturava aos demais amapaenses em total clima de festa, registrado por drones que davam a dimensão da passeata. Sobre a caçamba de uma caminhonete, o senador Davi Alcolumbre (União Brasil), anunciado como o futuro presidente do Congresso, enumerava e comemorava as obras que foram realizadas na região — e prometia mais avanços caso o seu aliado fosse eleito prefeito. Cenas como essas se repetiram ao longo dos últimos meses nos principais municípios do estado — numa campanha vitoriosa que elegeu nada menos do que doze dos dezesseis prefeitos apoiados pelo grupo. Sempre junto, o quarteto foi apelidado de Time Davi, referência ao mandachuva do grupo e guardião do segredo do sucesso.

NAS RUAS - Arthur Lira: “Por onde passei, senti emoção e reconhecimento” (@oficialarthurlira/Instagram)

E qual seria a chave que abriu as portas para esse triunfo? A eleição municipal deste ano foi a primeira disputada após a consolidação do chamado orçamento secreto, uma modalidade que permitiu a deputados e senadores enviarem 26 bilhões de reais do Orçamento federal para suas bases políticas sem serem identificados e sem nenhum critério objetivo. Esse dinheiro vai parar nos cofres dos municípios amigos; quando bem utilizado, é transformado em hospitais, escolas, praças ou quadras esportivas — e gera dividendos políticos. O caso do Amapá é exemplar: com 800 000 habitantes, menos de 0,5% da população brasileira, o estado recebeu quase 400 milhões de reais por meio dessas emendas. À época da criação do orçamento secreto, Davi Alcolumbre era o presidente do Senado e se notabilizou como um dos principais articuladores da distribuição das verbas. “Nunca tivemos uma gestão que fizesse tanto em tão pouco tempo. Nós estamos encaminhando os recursos federais, mas aqui o prefeito está executando em benefício do povo”, discursou o senador, enquanto fazia campanha em Tartarugalzinho, cidade que recebeu 48 milhões de reais, proporcionalmente mais dinheiro do que foi enviado a São Paulo, a maior metrópole da América Latina. O prefeito foi eleito com 6 733 votos, 73% do total.

Não por acaso, os partidos que formam o bloco conhecido como Centrão — PSD, MDB, PP, Republicanos e o União Brasil do ex e provável futuro presidente do Senado — elegeram o maior número de prefeitos. Artífice dessas emendas entre os deputados, o presidente da Câmara, Arthur Lira (PP-AL), é outro que comemorou o resultado das urnas ao eleger aliados em 42 dos 102 municípios do seu estado. Um deles é seu pai, Benedito de Lira, que, aos 82 anos, vai comandar Barra de São Miguel por mais quatro anos. Os cofres de Alagoas foram turbinados com 1 bilhão de reais apenas em emendas do orçamento secreto — e, para não fugir à regra, a cidade gerida por Biu de Lira foi a maior beneficiada em termos proporcionais. Com uma população de 8 000 pessoas, recebeu 10 milhões de reais, 1 100% acima da média nacional. “Por onde passei, senti a emoção e o reconhecimento pelo trabalho que realizamos em Brasília para trazer recursos que mudam a vida da nossa gente para melhor. São milhares de casas, diversas unidades de saúde, escolas, pavimentação de centenas de ruas. São tratores que mudam a vida no campo, ações que desenvolvem agricultura e atraem empresas”, comemorou Lira durante a campanha. Biu recebeu 4 563 dos 7 042 votos depositados nas urnas.

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É um ciclo vicioso para os cofres públicos, mas virtuoso para os parlamentares. Quanto maior é o partido, maior o seu poder de influência na comissão de orçamento. Santana do Ipanema aparece na segunda colocação no ranking dos municípios de Alagoas que proporcionalmente mais receberam recursos. Foram 57 milhões de reais nos últimos quatro anos. A cidade é reduto eleitoral de Isnaldo Bulhões, líder do MDB na Câmara dos Deputados. Comandado por Baleia Rossi, o MDB é hoje o maior partido em número de prefeituras — posto que vai perder a partir de janeiro para o PSD. Com o fim do mandato de Christiane Bulhões, irmã do deputado, foi eleito Eduardo Bulhões, o seu sobrinho. O mote da campanha, claro, eram as obras. “Esse é o projeto da certeza de que nós continuaremos com os investimentos garantidos para o nosso município”, afirmou Isnaldo durante um comício. “Dudu” foi eleito com 16 302 votos dos 26 535 registrados. Na próxima eleição, fará campanha para o tio, lembrando que foi ele quem levou as obras para a cidade. É por isso que, via de regra, os partidos do Centrão estão mais preocupados em fortalecer as bases eleitorais e incrementar as suas bancadas de deputados, que são a fonte da verba pública que abastece os cofres das legendas, do que em encabeçar uma disputa presidencial.

REPUBLICANO - Hugo Motta: sucesso em Patos, a cidade comandada pelo pai, reeleito
REPUBLICANO - Hugo Motta: sucesso em Patos, a cidade comandada pelo pai, reeleito (@hugomottapb/Instagram)

A matemática não falha: em geral, candidatos a deputado recebem o dobro de votos em municípios governados por um prefeito do seu partido, conforme mostra um estudo elaborado pelo doutor em ciência política e professor da Universidade do Estado do Rio de Janeiro, Fernando Meireles. Ou seja, ao mesmo tempo que injetam recursos em seus rincões e garantem a eleição de aliados, parlamentares saem na frente quando têm o domínio de mais prefeituras. “Se o partido como um todo cresce ou mantém o seu tamanho na Câmara, ele pode barganhar para pelo menos manter os ministérios que já tinha, para ter mais orçamento ou para conseguir mais uma pasta. Com mais recursos, eu consigo expandir a minha capilaridade e atrair mais prefeitos para a minha base. É assim que a roda gira”, afirma Meireles. Outros exemplos dessa roda girando se espalharam Brasil afora. Relator do Orçamento em 2020, o deputado Domingos Neto (PSD-CE) viu a mãe ser eleita prefeita de Tauá pela quinta vez. O município cearense também lidera, em proporção, o recebimento das verbas secretas, com mais de 150 milhões de reais, o que representa 2 000% da média nacional.

Na Bahia, a cidade de Campo Formoso só recebeu menos verba do que a capital, Salvador: foram depositados 57 milhões de reais na conta da prefeitura, que reelegeu com facilidade Elmo Nascimento, irmão de Elmar Nascimento, braço direito de Arthur Lira e líder do União Brasil na Câmara. Com outros 42 milhões de reais, a prefeitura de Patos, cidade do sertão da Paraíba, garantiu mais um mandato a Nabor Wanderley, pai do deputado Hugo Motta, líder do Republicanos na Câmara.

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MUDANÇA - Baleia Rossi: MDB vai perder o posto de maior partido para o PSD
MUDANÇA - Baleia Rossi: MDB vai perder o posto de maior partido para o PSD (@baleia.rossi/Instagram)

Apesar de o Centrão ser aliado e ocupar importantes ministérios no governo Lula, o avanço da turma incomodou. Em nota, o PT criticou: “O resultado do primeiro turno de 2024 aponta o início da recuperação eleitoral do PT nos municípios, num cenário que mais uma vez favoreceu a eleição ou reeleição de candidatos das legendas da centro-direita e direita dominantes no Congresso Nacional, com acesso a emendas parlamentares bilionárias e no comando das máquinas públicas municipais. O alto índice de reeleições, que beira os 80% nas cidades que mais receberam emendas parlamentares, confirma essa distorção no sistema político”. O partido do presidente da República amargou o nono lugar em número de prefeitos eleitos. Em alguns casos, nem o dinheiro resolve.



Publicado em VEJA de 11 de outubro de 2024, edição nº 2914



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A decisão do CNJ sobre aposentar ‘Moro do Rio’

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A decisão do CNJ sobre aposentar ‘Moro do Rio’

Matheus Leitão

 

O Conselho Nacional de Justiça (CNJ) vai decidir, no dia 22 de outubro, se aposenta compulsoriamente a juíza Adriana Maria dos Remédios Branco de Moraes Cardenas Tarazona.



A magistrada ficou famosa por se comparar, no texto de uma sentença, ao ex-juiz Sergio Moro, que teve uma atuação considerada punitivista no curso dos processos da extinta Operação Lava Jato.

A juíza responde a acusações por quebra de sigilo sem fundamentação e por condutas arbitrárias, como usurpação de função pública, instauração de ação sem provocação, extrapolação de competência e manipulação processual, entre outras.

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As acusações contra a juíza Adriana Tarazona partem de advogados que procuraram o CNJ, que é o órgão de controle do Judiciário, para solicitar a revisão das punições impostas à magistrada pelo Tribunal Regional do Trabalho da 1ª Região (TRT-1). Os advogados afirmam que a juíza quebrou o sigilo fiscal deles em processos dos quais não eram parte, sem apresentação de justificativa legal para tanto. A Procuradoria-Geral da República manifestou-se favoravelmente à aposentadoria compulsória de Tarazona.

Os advogados alegam que a pena de censura, aplicada pelo TRT-1 em 2021, é insuficiente porque o comportamento da juíza é reincidente. Eles pedem uma pena mais severa, como a disponibilidade ou a aposentadoria compulsória.

Adriana Tarazona já foi alvo de Processos Administrativos Disciplinares (PADs) anteriormente. Em um deles, foi punida por uso de expressões inapropriadas e de baixo calão contra uma perita judicial – atitude que violou o Código de Ética da Magistratura. Em outro, foi removida compulsoriamente da Vara do Trabalho de Barra Mansa para a 25ª Vara do Trabalho da capital do Rio de Janeiro.

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No procedimento em curso no CNJ, a magistrada também é suspeita de manipular o sistema eletrônico do TRT-1 para inserir dados processuais de forma irregular e de continuar a proferir sentenças em dezenas de processos mesmo após seu afastamento. Outro ponto central das acusações diz respeito à permissão da magistrada para que sua enteada usurpasse função pública, frequentando a Vara do Trabalho de Barra Mansa e realizando tarefas administrativas sem nenhum vínculo oficial com o tribunal. A enteada teria manipulado processos e até redigido sentenças – o que é considerado uma grave violação dos princípios da administração pública.

No processo, Adriana Tarazona nega as acusações. Ela argumenta que a quebra de sigilo fiscal era necessária para a condução dos processos e que sua enteada jamais realizou qualquer função pública.

A juíza Adriana Tarazona ficou famosa em 2018, quando se comparou ao então juiz federal Sergio Moro. Na época, Moro ainda desfrutava de alta popularidade e conduzia à mão de ferro os processos da hoje extinta Operação Lava Jato. Por causa do cometimento de abusos e irregularidades, as decisões de Moro, depois, seriam anuladas. Em uma sentença, naquele ano, a juíza escreveu: “Confesso a todos os que leem esta peça – e a lerão, certamente, em um futuro breve, que me sinto hoje, aqui de frente deste computador, como um Sergio Moro da vida”.

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As vagas no STJ e o ciclo perpétuo da desigualdade…

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As vagas no STJ e o ciclo perpétuo da desigualdade...

Matheus Leitão

O mais recente relatório sobre desenvolvimento humano do Programa das Nações Unidas para o Desenvolvimento (Pnud) afirma que as mulheres negras constituem uma parcela significativa da população brasileira, somando cerca de 60 milhões de pessoas, o equivalente a 28,5% do total. Elas também representam 28,4% da força de trabalho e são responsáveis pela maioria das famílias no país.

Em uma nação que preza pela justiça social e pela diversidade, seria razoável esperar que essas mulheres estivessem adequadamente representadas nos tribunais superiores. No entanto, as listas de nomeações para o Superior Tribunal de Justiça (STJ), divulgadas nesta semana, revelam uma realidade alarmante: uma profunda disparidade de oportunidades, reflexo da persistente exclusão social.

Mulheres negras raramente aparecem nessas listas e, quando o fazem, representam uma exceção que apenas confirma a regra. As nomeações continuam majoritariamente destinadas a homens brancos, e as poucas mulheres indicadas são invariavelmente brancas.

Essa incongruência levanta dúvidas sobre a legitimidade das decisões judiciais, que deveriam refletir a diversidade da sociedade. Em vez disso, perpetua-se um ciclo de exclusão que mantém o status quo, retardando a evolução do Judiciário em termos de representatividade e equidade.

A necessidade de mudança é premente. Não se trata apenas de uma questão de justiça social, mas de um requisito para a integridade e eficácia do sistema judiciário. Com 31 membros, dos quais apenas cinco são mulheres e apenas dois são homens negros, o STJ precisa adotar uma postura ativa em favor da diversidade. Isso não apenas alinha a corte aos valores da sociedade que deveria representar, mas também enriquece seu funcionamento, incorporando novas perspectivas e experiências, fundamentais para uma jurisprudência mais justa e inclusiva.

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É lamentável ouvir que ainda há escassez de candidatos negros qualificados, especialmente quando, nas raras ocasiões em que participam do processo de seleção, são frequentemente preteridos.

Diante dessa realidade, surge a pergunta: quem detém o poder e a responsabilidade de quebrar esses padrões históricos de exclusão? A resposta demanda um compromisso com a diversidade e inclusão, por meio de políticas eficazes e ações afirmativas que garantam que todas as vozes sejam ouvidas e valorizadas nos espaços de poder.

Recentemente, o presidente Lula e o presidente do STJ, Herman Benjamin, externaram publicamente o problema, mas não agiram de acordo com o próprio discurso quando tiveram mais uma oportunidade de diminuir essa vergonhosa desigualdade. Existe um nome para isso no vocabulário da língua portuguesa. Chama demagogia.



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Eleições 2024: Onde assistir ao debate do 2º turno…

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Eleições 2024: Onde assistir ao debate do 2º turno...

Pedro Cardoso

O segundo debate entre os candidatos à Prefeitura de São Paulo, Ricardo Nunes (MDB) e Guilherme Boulos (PSOL), vai acontecer durante a manhã de hoje, dia 17. No primeiro debate do segundo turno, que ocorreu na TV Bandeirantes na noite da última segunda-feira, 14, o apagão que deixou 2,1 milhões de pessoas sem energia elétrica em São Paulo e na região metropolitana pautou a maior parte do tempo.

De acordo com a última pesquisa Quaest, divulgada ontem, 16, Nunes está com 45% das intenções de voto contra 33% de Boulos. Outros 19% declaram a intenção de votar em branco ou nulo, e 3% se dizem indecisos. A pesquisa, encomendada pela TV Globo, foi realizada entre 13 e 15 de outubro e entrevistou presencialmente 1.204 pessoas acima de 16 anos na cidade de São Paulo. A margem de erro é de três pontos percentuais para mais ou para menos.

Onde assistir o debate do 2º turno de São Paulo hoje, dia 17?

O segundo debate dos candidatos à Prefeitura de São Paulo, Ricardo Nunes (MDB) e Guilherme Boulos (PSOL), vai ocorrer hoje, às 10h20 e será transmitido pela RedeTV! e pelos sites e redes sociais do UOL e da Folha de S. Paulo. O debate terá duração aproximada de 2 horas.

No total serão cinco blocos de debate, no primeiro e no terceiro os candidatos terão 12 minutos para administrar da forma que preferirem, em um confronto direto entre eles. No segundo e no quarto blocos os candidatos deverão responder questionamentos de jornalistas do UOL e da Folha de São Paulo. A pergunta terá um tempo máximo de um minuto e o candidato terá até dois minutos para responder. No quinto bloco, os candidatos terão dois minutos livres para fazer as suas considerações finais.

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Outros debates dos candidatos à Prefeitura de São Paulo:

– Debate na TV Record, dia 19, às 21 horas;

– Debate no UOL/Folha de S. Paulo, dia 21, às 10 horas;

– Debate na TV Globo, dia 25, às 22 horas.

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Quando acontece a votação do segundo turno das eleições?

A votação do segundo turno das eleições vai ocorrer no domingo, dia 27 de outubro.

 





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