POLÍTICA
Partidos com maiores fatias do orçamento secreto s…
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Marcela Mattos
Em meio a uma pequena multidão no interior do Amapá, o ministro Waldez Góes, da Integração e do Desenvolvimento Regional, tomou a dianteira montado em uma bicicleta e saiu ziguezagueando entre uma tropa que chacoalhava bandeiras para o alto. O líder do governo no Congresso, senador Randolfe Rodrigues, se protegia do calorão com um boné que levava o nome e o número do seu candidato na região e atenciosamente parava para distribuir fotos e abraços. Enquanto isso, o governador Clécio Luis se misturava aos demais amapaenses em total clima de festa, registrado por drones que davam a dimensão da passeata. Sobre a caçamba de uma caminhonete, o senador Davi Alcolumbre (União Brasil), anunciado como o futuro presidente do Congresso, enumerava e comemorava as obras que foram realizadas na região — e prometia mais avanços caso o seu aliado fosse eleito prefeito. Cenas como essas se repetiram ao longo dos últimos meses nos principais municípios do estado — numa campanha vitoriosa que elegeu nada menos do que doze dos dezesseis prefeitos apoiados pelo grupo. Sempre junto, o quarteto foi apelidado de Time Davi, referência ao mandachuva do grupo e guardião do segredo do sucesso.
E qual seria a chave que abriu as portas para esse triunfo? A eleição municipal deste ano foi a primeira disputada após a consolidação do chamado orçamento secreto, uma modalidade que permitiu a deputados e senadores enviarem 26 bilhões de reais do Orçamento federal para suas bases políticas sem serem identificados e sem nenhum critério objetivo. Esse dinheiro vai parar nos cofres dos municípios amigos; quando bem utilizado, é transformado em hospitais, escolas, praças ou quadras esportivas — e gera dividendos políticos. O caso do Amapá é exemplar: com 800 000 habitantes, menos de 0,5% da população brasileira, o estado recebeu quase 400 milhões de reais por meio dessas emendas. À época da criação do orçamento secreto, Davi Alcolumbre era o presidente do Senado e se notabilizou como um dos principais articuladores da distribuição das verbas. “Nunca tivemos uma gestão que fizesse tanto em tão pouco tempo. Nós estamos encaminhando os recursos federais, mas aqui o prefeito está executando em benefício do povo”, discursou o senador, enquanto fazia campanha em Tartarugalzinho, cidade que recebeu 48 milhões de reais, proporcionalmente mais dinheiro do que foi enviado a São Paulo, a maior metrópole da América Latina. O prefeito foi eleito com 6 733 votos, 73% do total.
Não por acaso, os partidos que formam o bloco conhecido como Centrão — PSD, MDB, PP, Republicanos e o União Brasil do ex e provável futuro presidente do Senado — elegeram o maior número de prefeitos. Artífice dessas emendas entre os deputados, o presidente da Câmara, Arthur Lira (PP-AL), é outro que comemorou o resultado das urnas ao eleger aliados em 42 dos 102 municípios do seu estado. Um deles é seu pai, Benedito de Lira, que, aos 82 anos, vai comandar Barra de São Miguel por mais quatro anos. Os cofres de Alagoas foram turbinados com 1 bilhão de reais apenas em emendas do orçamento secreto — e, para não fugir à regra, a cidade gerida por Biu de Lira foi a maior beneficiada em termos proporcionais. Com uma população de 8 000 pessoas, recebeu 10 milhões de reais, 1 100% acima da média nacional. “Por onde passei, senti a emoção e o reconhecimento pelo trabalho que realizamos em Brasília para trazer recursos que mudam a vida da nossa gente para melhor. São milhares de casas, diversas unidades de saúde, escolas, pavimentação de centenas de ruas. São tratores que mudam a vida no campo, ações que desenvolvem agricultura e atraem empresas”, comemorou Lira durante a campanha. Biu recebeu 4 563 dos 7 042 votos depositados nas urnas.
É um ciclo vicioso para os cofres públicos, mas virtuoso para os parlamentares. Quanto maior é o partido, maior o seu poder de influência na comissão de orçamento. Santana do Ipanema aparece na segunda colocação no ranking dos municípios de Alagoas que proporcionalmente mais receberam recursos. Foram 57 milhões de reais nos últimos quatro anos. A cidade é reduto eleitoral de Isnaldo Bulhões, líder do MDB na Câmara dos Deputados. Comandado por Baleia Rossi, o MDB é hoje o maior partido em número de prefeituras — posto que vai perder a partir de janeiro para o PSD. Com o fim do mandato de Christiane Bulhões, irmã do deputado, foi eleito Eduardo Bulhões, o seu sobrinho. O mote da campanha, claro, eram as obras. “Esse é o projeto da certeza de que nós continuaremos com os investimentos garantidos para o nosso município”, afirmou Isnaldo durante um comício. “Dudu” foi eleito com 16 302 votos dos 26 535 registrados. Na próxima eleição, fará campanha para o tio, lembrando que foi ele quem levou as obras para a cidade. É por isso que, via de regra, os partidos do Centrão estão mais preocupados em fortalecer as bases eleitorais e incrementar as suas bancadas de deputados, que são a fonte da verba pública que abastece os cofres das legendas, do que em encabeçar uma disputa presidencial.
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A matemática não falha: em geral, candidatos a deputado recebem o dobro de votos em municípios governados por um prefeito do seu partido, conforme mostra um estudo elaborado pelo doutor em ciência política e professor da Universidade do Estado do Rio de Janeiro, Fernando Meireles. Ou seja, ao mesmo tempo que injetam recursos em seus rincões e garantem a eleição de aliados, parlamentares saem na frente quando têm o domínio de mais prefeituras. “Se o partido como um todo cresce ou mantém o seu tamanho na Câmara, ele pode barganhar para pelo menos manter os ministérios que já tinha, para ter mais orçamento ou para conseguir mais uma pasta. Com mais recursos, eu consigo expandir a minha capilaridade e atrair mais prefeitos para a minha base. É assim que a roda gira”, afirma Meireles. Outros exemplos dessa roda girando se espalharam Brasil afora. Relator do Orçamento em 2020, o deputado Domingos Neto (PSD-CE) viu a mãe ser eleita prefeita de Tauá pela quinta vez. O município cearense também lidera, em proporção, o recebimento das verbas secretas, com mais de 150 milhões de reais, o que representa 2 000% da média nacional.
Na Bahia, a cidade de Campo Formoso só recebeu menos verba do que a capital, Salvador: foram depositados 57 milhões de reais na conta da prefeitura, que reelegeu com facilidade Elmo Nascimento, irmão de Elmar Nascimento, braço direito de Arthur Lira e líder do União Brasil na Câmara. Com outros 42 milhões de reais, a prefeitura de Patos, cidade do sertão da Paraíba, garantiu mais um mandato a Nabor Wanderley, pai do deputado Hugo Motta, líder do Republicanos na Câmara.
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Apesar de o Centrão ser aliado e ocupar importantes ministérios no governo Lula, o avanço da turma incomodou. Em nota, o PT criticou: “O resultado do primeiro turno de 2024 aponta o início da recuperação eleitoral do PT nos municípios, num cenário que mais uma vez favoreceu a eleição ou reeleição de candidatos das legendas da centro-direita e direita dominantes no Congresso Nacional, com acesso a emendas parlamentares bilionárias e no comando das máquinas públicas municipais. O alto índice de reeleições, que beira os 80% nas cidades que mais receberam emendas parlamentares, confirma essa distorção no sistema político”. O partido do presidente da República amargou o nono lugar em número de prefeitos eleitos. Em alguns casos, nem o dinheiro resolve.
Publicado em VEJA de 11 de outubro de 2024, edição nº 2914
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A ‘mão de ferro’ de Janja e a ‘hora da sopa’ de Lula
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22 de fevereiro de 2025
Gustavo Maia
Diante da conhecida “mão de ferro” da primeira-dama Janja sobre o marido no Palácio da Alvorada, residência oficial do presidente em Brasília, petistas passaram a ironizar que o fim do expediente de Lula no Planalto, geralmente por volta das 18h, virou a “hora da sopa”. Depois disso, praticamente não há quem consiga falar com ele.
Janja, aliás, foi tida por aliados de Lula como o principal alvo da carta do advogado Antonio Carlos de Almeida Castro, conhecido como Kakay, em que ele aponta que o presidente, neste terceiro mandato, está “isolado”, “capturado”, por circunstâncias diversas, “principalmente pessoais”. Mais até que o ministro da Casa Civil, Rui Costa, que também tem sido bastante criticado.
“Mas o Lula do 3º mandato , por circunstâncias diversas, políticas e principalmente pessoais, é outro. Não faz política. Está isolado. Capturado. Não tem ao seu lado pessoas com capacidade de falar o que ele teria que ouvir. Não recebe mais os velhos amigos políticos e perdeu o que tinha de melhor: sua inigualável capacidade de seduzir, de ouvir, de olhar a cena política”, escreveu Kakay.
Na primeira solenidade pública após a divulgação do texto, na terça-feira, aliados de Lula notaram o quanto Janja estava discreta e até mesmo apagada — durante a recepção a Marcelo Rebelo de Sousa, presidente de Portugal, no Itamaraty, na terça.
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Enfraquecido, governo Lula se rende de novo a Davi…
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22 de fevereiro de 2025
Daniel Pereira
Desde o início do terceiro mandato de Lula, o governo considera menos turbulenta a relação política com o Senado do que com a Câmara. Com a esperada reforma ministerial, o presidente da República espera melhorar a articulação com as duas Casas, ampliando o espaço e o poder dos parlamentares na Esplanada. Enquanto esse rearranjo não ocorre, o mandatário faz o que pode para agradar ao senador Davi Alcolumbre (União Brasil-AP), o novo chefe do Poder Legislativo.
Até aqui, a parceria entre as partes tem rendido dividendos para ambos os lados. Na quarta-feira 19, um dia após a apresentação da denúncia da Procuradoria-Geral da República (PGR) contra o ex-presidente Jair Bolsonaro por tentativa de golpe de Estado, Alcolumbre indicou que o projeto que anistia condenados por atos golpistas não será pautado, porque, segundo ele, divide a sociedade e não interessa ao país. “Isso não é um assunto que nós estamos debatendo”, afirmou. “Não é um assunto dos brasileiros”.
A declaração foi dada no mesmo dia em que o Senado, sob a batuta de Alcolumbre, reverteu uma decisão anterior do governo e — agora com o aval dos próprios governistas — aprovou um projeto que autoriza o pagamento de emendas parlamentares de orçamentos anteriores, criando uma conta estimada em pelo menos 2,6 bilhões de reais. Desde a sua volta ao comando da Casa, foi a primeira vitória do senador, que acumulou poder nos últimos anos justamente por controlar boa parte do bolo das emendas. Foi assim no governo Bolsonaro. Será assim, ao que tudo indica, sob Lula.
O petróleo é nosso
Aliados de conveniência, Lula e Alcolumbre são defensores da exploração de petróleo na Foz do Amazonas, que pode ajudar no desenvolvimento econômico do país e de uma série de estados, como o Amapá, berço eleitoral do senador. Na primeira metade de seu mandato, o presidente pouco tratou do assunto em público, mas com a mudança na cúpula do Congresso ele entrou de vez no debate, motivado por uma cobrança do senador.
Na primeira audiência que teve com Lula após ser eleito para a chefia do Senado, Alcolumbre reclamou da demora do Instituto Brasileiro de Meio Ambiente e Recursos Naturais Renováveis (Ibama) para emitir a licença ambiental que pode abrir caminho para a exploração de petróleo na Foz do Amazonas.
O petista anotou o recado e dias depois, numa entrevista a uma rádio, defendeu o projeto, alegando que a exploração de petróleo na chamada “margem equatorial” pode ser realizada sem prejudicar o meio ambiente. Não parou por aí.
Em outra entrevista, concedida em Macapá, para onde viajou na companhia de Alcolumbre, Lula criticou o que chamou de “lenga lenga” do Ibama para autorizar a pesquisa sobre a exploração de petróleo na região. É aquela história: quanto mais enfraquecido um governo, maior a necessidade de afagar aliados.
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Lula diz que nem ministros sabem o que governo est…
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22 de fevereiro de 2025
Lucas Mathias
O presidente Luiz Inácio Lula da Silva (PT) afirmou, na comemoração dos 45 anos do Partido dos Trabalhadores, neste sábado, 22, que ouviu durante uma reunião ministerial nas últimas semanas que seus ministros não sabem o que tem sido feito no governo. O recado, segundo o presidente, é retrato da postura do Planalto, que não tem comunicado seus feitos como gostaria, o que tem reflexo na população. “Ora, se o ministério não sabe, o povo, muito menos”, afirmou. A celebração da sigla acontece no Centro da cidade do Rio de Janeiro.
A declaração de Lula foi dada ao final de sua fala, que durou cerca de 50 minutos, no evento. O presidente foi o último a pegar o microfone e discursar no palco, para centenas de apoiadores e militantes do partido. Ao reconhecer as falhas na comunicação de seu governo, o mandatário reconheceu que o problema dificulta, inclusive, a atuação dos petistas nas ruas.
“Cabe ao governo fazer as coisas corretas e dar informação para vocês. Porque um governo que não dá informações, às vezes, não tem como militante defender. E eu sei que nós não demos as informações”, ponderou.
Em seguida, Lula citou o episódio da reunião ministerial, antes de prometer maior clareza na divulgação dos atos governamentais.
“Fiz uma reunião ministerial faz mais ou menos vinte dias. E eu descobri na reunião, Gleisi, que o ministério do meu governo não sabe o que nós estamos fazendo. Ora, se o ministério não sabe, o povo, muito menos. Então, companheiros, agora vocês vão saber”, completou.
A forte fala de Lula vem pouco mais de um mês depois de o presidente trocar seu ministro da Secretaria de Comunicação, ao dar posse para Sidônio Palmeira, que assumiu o lugar até então ocupado pelo deputado federal Paulo Pimenta (PT-RS).
Para as próximas semanas, ainda está prevista uma reforma ministerial, que pode dar mais espaço a outros partidos na Esplanada e promover uma dança das cadeiras no desenho atual — outro sintoma acusado na declaração do petista.
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