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Quem é Francisco Lopera, médico que revolucionou Alzheimer – 16/11/2024 – Equilíbrio e Saúde

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Jennie Erin Smith

Em 1978, Francisco Lopera fez o que os médicos recém-formados da Colômbia e de grande parte da América Latina já faziam havia muito tempo: partiu para um ano obrigatório de trabalho em uma região remota do país, onde um médico rural inexperiente poderia ser o único profissional de saúde em um raio de quilômetros. Lopera, que nasceu na região andina de Antioquia e antes da faculdade de medicina conhecia basicamente as montanhas e a vida rural, prestou seu serviço na região de Darién, na costa caribenha, perto do Panamá.

Ali, Lopera, colombiano pioneiro nas pesquisas de Alzheimer que morreu em setembro aos 73 anos, atendia casos de esfaqueamento, picadas de cobra, partos complicados, queimaduras e febres em um hospital que tinha eletricidade apenas durante metade do dia. Em certa ocasião, foi sequestrado por guerrilheiros marxistas. Em outra, teve de fugir de um tiroteio.

Quando o conheci em 2017, para iniciar a pesquisa para meu livro sobre famílias com Alzheimer, trabalho a que acabou dedicando sua vida, ele me contou uma história sobre dois irmãos jovens que tinham morrido um depois do outro em seu hospital, de causas desconhecidas. Lopera foi até a casa da família em uma clareira remota na selva, onde descobriu que os irmãos sobreviventes dos meninos tinham mordidas de morcegos hematófagos nos dedos. Enviou os corpos para um laboratório de patologia a horas de distância de barco, e os patologistas confirmaram que eles haviam contraído raiva. Quando o governo trouxe um especialista na doença para investigar, Lopera se juntou a ele.

Depois daquela experiência –em que passou longas noites na floresta tropical, procurando por poleiros escondidos, absorvido pela história natural da raiva e dos morcegos–, decidiu se tornar epidemiologista da raiva. Mas esse não seria seu destino. Seus interesses eram ecléticos e mudavam rapidamente e, alguns anos depois, tornou-se residente de neurologia em Medellín.

Em 1984, Lopera examinou um fazendeiro na faixa dos 40 anos que parecia ter demência. O médico novamente tomou a iniciativa inusitada de viajar até a casa da família, em um vilarejo montanhoso como aquele onde havia nascido. Constatou que não era apenas o fazendeiro que apresentava sintomas de demência –um irmão seu também parecia estar sendo afetado. O médico havia descoberto o que viria a ser a maior família do mundo portadora da doença de Alzheimer de início precoce. Esta compartilhava uma mutação genética, mais tarde apelidada de mutação paisa, que era exclusiva de sua região na Colômbia. Passou as quatro décadas seguintes estudando os 6.000 membros daquela família.

Uma coisa é criar um grupo de pesquisa em uma população com a doença, iniciar a busca por um gene da doença de Alzheimer, criar um banco de cérebros para autópsia, fazer estudos de longo prazo em portadores de mutações para entender a evolução da doença e investigar terapias que possam preveni-la ou retardá-la. Outra coisa bem diferente é fazer tudo isso com pouco dinheiro, em um país que luta com sucessivas ondas de violência decorrentes da política e do narcotráfico.

No fim da década de 1980, quando o trabalho de Lopera com as famílias colombianas estava apenas começando, sua universidade foi atacada por paramilitares de direita associados a traficantes de drogas; várias das vítimas eram médicos. Duas décadas depois, enquanto recrutava participantes para um estudo clínico de referência de uma terapia para prevenir o Alzheimer, Lopera e seus colegas ainda enfrentavam assédio, ameaças e sequestros. Os vilarejos que abrigavam muitos de seus pacientes estavam nas garras de exércitos guerrilheiros e paramilitares.

Acabei por passar sete anos em Medellín, observando Lopera e as famílias com Alzheimer que ele estudava. Quando cheguei, ele estava com quase 70 anos, tinha um charme desarmante, um talento especial para estabelecer alianças produtivas com pesquisadores no exterior e um jeito de atender os pacientes que Kenneth Kosik, pesquisador americano de neurologia e colaborador de longa data de Lopera, descreveu como o de “um médico do interior que ainda acreditava na imposição de mãos”.

Eu adorava vê-lo fazendo suas rondas na Universidade de Antioquia, onde avaliava pessoas com Alzheimer e outras doenças neurodegenerativas na frente de seus alunos e colegas. Estabelecia com os pacientes um diálogo natural, afável e discreto; era como se estivessem batendo papo com um velho amigo em alguma taberna do interior. No entanto, ele estava coletando informações que lhe permitiam diagnosticar a demência ou avaliar seu progresso, com uma precisão que poucos poderiam igualar.

As pessoas que ele estudou eram de famílias sofridas, tipicamente pobres, com raízes rurais, que viam poucas perspectivas de tratamento ou cura. Elas sabiam, assim como ele, que só as gerações posteriores se beneficiariam de seus esforços, e mesmo assim com muita sorte. Apesar disso, permaneciam com ele –pais, filhos e netos– para sucessivos estudos, passando por exames cerebrais, coletas de sangue, punções lombares e testes cognitivos. A partir de 2013, centenas de pessoas se inscreveram em um estudo clínico de um anticorpo experimental, chamado crenezumabe, na esperança de que este pudesse retardar ou prevenir a doença.

Em 2019, as famílias ficaram sabendo do extraordinário caso de Aliria Piedrahita de Villegas, de Medellín, portadora da temida mutação paisa, que chegou aos 70 anos antes de desenvolver sintomas de Alzheimer: um atraso de 30 anos. Essa descoberta e o estudo contínuo de seus genes e de seu cérebro deram início a uma nova abordagem para o tratamento do Alzheimer, elucidando mecanismos genéticos e celulares diferentes daqueles que, havia muito tempo, se presumia estarem envolvidos.

Mas a decepção se aproximava. No verão de 2022, Lopera ficou sabendo que, apesar de todo o alarde em seu começo, o ensaio clínico do crenezumabe não havia mostrado nenhum benefício. O fracasso dos medicamentos para Alzheimer havia se tornado a norma no mundo inteiro, mas isso não tornou as coisas mais fáceis para ele nem para as famílias. Os participantes do estudo e seus entes queridos se reuniram em um auditório na Universidade de Antioquia, como faziam regularmente durante o curso do estudo de uma década, para ouvir “el doctor”.

Naquela época, ele já era uma figura menos humilde do que em 1978. Embora o ensaio clínico tivesse produzido um resultado negativo, sua execução bem-sucedida em meio a circunstâncias extremamente difíceis o transformara em um queridinho do mundo da pesquisa sobre Alzheimer. O médico recebia cada vez mais elogios, prêmios, atenção da mídia e propostas. Por outro lado, pouco visitava a zona rural.

Naquela manhã de sábado em agosto de 2022, no entanto, Lopera era mais uma vez um médico do interior, diante de uma sala de pessoas interioranas. Nenhum de seus colaboradores estrangeiros ou patrocinadores de empresas farmacêuticas o acompanhava, apenas seus colegas veteranos de sua equipe de pesquisa, o Grupo de Neurociências de Antioquia, que vestiam camisa polo preta combinando e formavam uma fila de recepção, em uma manifestação solene. Quando Lopera deu as más notícias no seu estilo gentil, mas franco, alguns participantes choraram. Os demais já tinham chorado antes: a notícia dos resultados já chegara a eles por outros canais, e talvez não tenha sido uma surpresa. Depois de 40 anos de participação em pesquisas clínicas, essas famílias aprenderam a resistir às falsas esperanças e ao desespero.

Com o passar do dia, o clima melhorou. A banda da universidade tocou, garçons serviram um farto almoço tradicional e ninguém parecia ter pressa de ir embora. Lopera dançou e dançou com os participantes do estudo. Era um dançarino fantástico desde seus dias de jovem médico em Darién. Dançou tantas músicas com tantos parceiros que, no fim da tarde, estava pingando de suor, parecendo prestes a entrar em colapso. Duvido que tenha havido um teste clínico em qualquer lugar do mundo que tenha terminado dessa maneira.



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‘Mulher’ significa fêmea biológica sob lei – DW – 16/04/2025

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'Mulher' significa fêmea biológica sob lei - DW - 16/04/2025

A Suprema Corte do Reino Unido decidiu na quarta -feira que o Reino Unido A lei de igualdades define uma mulher como um indivíduo nascido biologicamente feminino.

“Os termos ‘mulher’ e ‘sexo’ na Lei da Igualdade se referem a uma mulher biológica”, disse o juiz da Suprema Corte, Patrick Hodge.

Cinco juízes supremos aprovaram por unanimidade o julgamento.

A decisão afirma que um Pessoa transgênero Com um certificado de reconhecimento de gênero (GRC), identificando -os como feminino não é considerado uma mulher sob a lei de igualdade do Reino Unido.

O caso se originou de uma lei escocesa de 2018 que exige 50% de representação feminina em conselhos públicos, que incluía mulheres trans em sua definição de mulheres.

Esta é uma notícia de última hora. Atualize para mais atualizações …



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O que Meloni da Itália pode alcançar em sua viagem aos EUA? – DW – 16/04/2025

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O que Meloni da Itália pode alcançar em sua viagem aos EUA? - DW - 16/04/2025

A direita Primeira Ministra Italiana Giorgia Meloni estará em Washington na quinta -feira para uma reunião com Presidente dos EUA Donald Trump. As agências de notícias concordam que a visita se concentrará particularmente na disputa tarifária entre os Estados Unidos e o União Europeia.

As tensões diminuíram um pouco desde que a viagem foi anunciada pela primeira vez. A UE fez uma pausa em tarifas de retaliação em aço e alumínio depois Donald Trump anunciou uma suspensão de 90 dias de 20% de tarifas na UE.

O presidente da Comissão da UE, Ursula von der Leyen, disse que a suspensão das tarifas é para dar uma chance às negociações com os EUA.

Meloni quer falar de tarifas

Apesar do atual detido, Teresa Coratella, vice -chefe do escritório de Relações Exteriores (ECFR) em Roma, antecipa que o principal objetivo de Meloni ainda é negociar tarifas.

Coratella, assim como Leo Goretti, do Instituto Italiano de Assuntos Internacionais (IAI), esperam que Meloni tente usar seu aparente bom relacionamento com Donald Trump para encontrar uma solução para o Conflito tarifário da UE -US.

Meloni foi o único chefe europeu de governo a participar da inauguração de Trump em janeiro. No início daquele mês, quando Meloni Visitou Trump em sua propriedade Mar-A-Lagoele a elogiou como uma “mulher fantástica”. Nos últimos meses, as fontes italianas costumam enfatizar que o governo italiano quer atuar como uma “ponte” entre os EUA e a UE.

Donald Trump e Giorgia Meloni falam informalmente, em uma sala ornamentada com uma árvore de Natal iluminada ao fundo. Eles estão de lado para a câmera, e a mão esquerda está no ombro direito dela.
Meloni e Trump têm um bom relacionamento: ela era a única Chefe de Governo da UE convidada para sua inauguração de 2025Imagem: Filippo Attili/Palazzo Chigi Press Office/AFP

Qual é a abordagem de Meloni?

Antes de sua viagem, Giorgia Meloni disse aos líderes empresariais que apoiava uma proposta da Comissão Europeia por zero tarifas entre os EUA e a UE. A Agência de Notícias da Reuters, citando um discurso, disse que aderiria a essa posição em sua visita a Washington.

O presidente da Comissão da UE, Ursula von der Leyen, costumava endossar um contrato tarifário zero para zero entre a UE e nós, mais recentemente em um post sobre X na semana passada.

No entanto, Leo Goretti, chefe do programa de política externa italiana do IAI, chama a abordagem de Meloni para os EUA de “aposta”.

“No entanto, ideologicamente próximo (Meloni) pode ser de Trump, ela não pode se alinhar com os EUA contra Bruxelas”, disse Goretti.

Itáliaacrescentou, não pode se dar ao luxo de se afastar da UE, especialmente não economicamente.

Giorgia Meloni, que chefia o partido de direita Fratelli D’Italia (irmãos da Itália), está sob pressão dos interesses econômicos domésticos.

Em 2024, a Itália teve um excedente de quase 40 bilhões de euros (US $ 45,5 bilhões) em comércio de mercadorias com os EUA-o terceiro maior da UE, depois da Alemanha e da Irlanda. Um total de 10% de todas as exportações italianas vão para os EUA.

Mas o mercado dos EUA ainda é muito menos importante para a economia italiana do que o mercado único da UE, enfatizou Goretti.

UE suspende tarifas de retaliação por 90 dias

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Meloni fala pela UE?

Bruxelas enfatizou repetidamente que a negociação de tarifas é fundamentalmente de responsabilidade da Comissão Europeia.

A porta -voz da UE, Arianna Podesta, disse que, à luz da próxima viagem, houve contato nos últimos dias entre o presidente da Comissão da UE, von der Leyen e o primeiro -ministro italiano Meloni. Uma comunicação adicional é planejada antes da partida de Meloni, e Podesta descreveu seu alcance como “muito bem -vindo e coordenado”.

O comissário comercial da UE, Maros Sefcovic, também visitou Washington nesta semana. Após a reunião, Sefcovic enfatizou que a UE estava disposta a trabalhar em direção a um “acordo justo“Incluindo a oferta de tarifas zero sobre bens industriais. Ele observou em um post em X que esse acordo exigiria um” esforço conjunto significativo de ambos os lados “.

O que Meloni pode alcançar?

Leo Goretti acredita que, para a UE, muito dependerá de como Meloni se posiciona em Washington. Ele ressalta que ela vacila entre defender a política zero-tarifária e criticar a UE.

Se ela seguir a linha zero-tarifária, isso será bem recebido em Bruxelas e por outros Estados-Membros.

Se, por outro lado, ela critica a UE e mudar o foco da discussão para questões internas, como burocracia excessiva e regulação excessiva, ela enviará um sinal negativo para Bruxelas.

Giorgia Meloni, uma mulher loira em um terno bege pálido, anda entre as bandeiras de vários países da UE, sorrindo.
Se Meloni se alinhar muito com Trump, isso causará problemas para ela dentro da UE Imagem: AFP via Getty Images

Goretti é cético sobre se Meloni alcançará algum resultado concreto em Washington, mas ele acredita que um resultado possível pode ser uma declaração apontando para um mercado transatlântico comum.

Isso pode incluir o alinhamento contra desafios comuns, como os colocados pela China.

A cientista política Teresa Coratella é ainda mais cética.

Meloni não tem mandato oficial da Comissão da UE, disse ela, e pensa que a França em particular não está feliz com a visita.

Coratella acha que é provável que a viagem de Meloni seja cuidadosamente encenada e apresentada publicamente como uma grande demonstração de alinhamento com Trump.

Isso, no entanto, tornaria a posição de Meloni na UE mais difícil, disse Coratella.

Este artigo foi originalmente escrito em alemão.



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Doutor de Berlim acusado de 15 acusações de assassinato – DW – 16/04/2025

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Doutor de Berlim acusado de 15 acusações de assassinato - DW - 16/04/2025

Promotores em Berlim acusou um médico de 15 acusações de assassinato na quarta -feira, alegando que ele administrou doses letais de medicação a pacientes com cuidados paliativos.

O médico de 40 anos, que trabalhou na equipe de cuidados paliativos de um serviço de enfermagem, teria atuado por malícia e outros motivos básicos.

O que sabemos sobre o caso?

De acordo com o escritório do promotor público, o médico teria matado um total de 15 pacientes cuidados pelo Serviço de Enfermagem entre setembro de 2021 e julho de 2024.

O homem supostamente administrou um medicamento de indução anestésico e, em seguida, um relaxante muscular para seus pacientes sem necessidade médica ou seu conhecimento e consentimento. Dizia -se que o último levou à paralisia dos músculos respiratórios, resultando em parada respiratória e morte em poucos minutos.

Em alguns casos, o suspeito supostamente incendiaram as casas de suas vítimas para encobrir suas ações.

As vítimas teriam entre 56 e 94 anos.

O acusado está sob custódia desde agosto de 2024 e ainda não comentou as acusações.

Durante o curso da investigação, o escritório do promotor público também ordenou exumações com investigações ainda em andamento em alguns casos.

O homem inicialmente suspendeu de quatro mortes no ano passado, depois que ele supostamente incendiou as casas das vítimas.

O número de mortos ainda poderia aumentar, mesmo depois que os investigadores descobriram mais vítimas possíveis que remontam a 2021.

Esta história está se desenvolvendo e será atualizada …

Editado por: Zac Crellin



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