Vinicius Torres Freire
São Paulo ficou um final de semana largada às moscas depois do temporal da sexta-feira passada (11). Ricardo Nunes (MDB), de histórico tão apagado quanto os faróis da cidade, perdeu uns pontos, diz o Datafolha. Mas ainda bate Guilherme Boulos (PSOL e apoiado pelo PT) por 61% a 39%, se a conta é feita por votos válidos. “Farol” é semáforo, em paulistês.
Alguns petistas fazem troça de Boulos e das alianças do partido. Mas, no primeiro turno, Boulos teve mais do que o triplo dos votos do candidato do PT a prefeito em 2020, que conseguiu apenas 8,7% e chegou em sexto lugar, atrás até do defenestrado Mamãe Falei. Diante desses e de outros resultados ruins, conviria que PT e esquerda deixassem de picuinhas.
A votação dos partidos à esquerda para prefeito neste 2024 foi a pior do século, em curva de degradação similar à da votação para deputado federal, com o que o centrão-direitão mais e mais domina o país. O PT elegeu quantidade diminuta de prefeitos. Não tem candidato a governador em São Paulo. Terá poucos puxadores de voto para o Congresso em 2026.
O cenário político-partidário é ruim; há nuvens cinzas de riscos econômicos se formando no horizonte. O forte aumento de salários e de benefícios sociais não ajuda a levantar avaliação do governo Lula. Além do caso nacional, há exemplos municipais, regionais e internacionais de que eleição é ainda menos a “economia, seu burro!”, como se dizia nas campanhas dos 1990.
A atividade econômica nos Estados Unidos vai muito bem. A possibilidade de Donald Trump ganhar a eleição é próxima de 50%. Uma vitória do cada vez mais lunático e afascistado Trump não apenas seria inspiração para as direitas. Poderia criar encrencas econômicas, a começar por uma alta de juros nos EUA (para começar, pois é o potencial de estrago de Trump é bem maior).
A atividade econômica na Argentina vai muito mal. Javier Milei, tio-avô político de Pablo Marçal, faz um acerto fiscal com o couro de boa parte dos argentinos (queda real de mais 18% no gasto com aposentadorias e benefícios sociais, de mais de 19% no salário dos servidores, de 78% no investimento público, de uns 7% no salário médio etc.). O PIB deve cair 4% neste ano.
A nota de confiança em Milei está ora em baixa, decerto, de 57,2% em dezembro para 43,2% em setembro (traduzindo um índice de confiança da Universidade Torcuato di Tella). Mas Milei ainda resiste, mesmo no fundo do poço de horrores sociais. Há mais na política argentina do que indicadores econômicos horríveis. Pode ser o cansaço terminal com os peronismos, a desmoralização de sindicatos e movimentos sociais ou o que seja. Mas há mais.
Economia não é tudo, mas há nuvens cinzas no horizonte brasileiro. Depois de cair bem, a inflação de alimentos (“alimentação no domicílio”) passou de 6% ao ano. O dólar morando na casa dos R$ 5,6 é um acúmulo de pressão inflacionária (Trump no poder e a anemia econômica na China podem manter ou piorar esse cenário). Os juros no atacado do mercado de dinheiro simplesmente estão desembestados. Não é prenúncio certo de problema, mas a vaca observa o brejo.
A derrota eleitoral, a falta de perspectiva ou de novo discurso políticos e riscos econômicos no horizonte deveriam suscitar chacoalhada grande nas esquerdas, o que não se vê ainda. Ou vão refazer a “bet” de 2014?
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